Usina
nuclear no sertão de Pernambuco ameaça índios pankarás
Quando o
governo transferiu a aldeia da margem do Rio São Francisco para um terreno
pedregoso e sem água, em Itacuruba, a 466 quilômetros do Recife, o então
cacique Geraldo Cabral pensou que o megaprojeto da Represa de Itaparica era o
último ataque à história dos pankarás, índios que resistiram, durante quatro
séculos, a jesuítas, franciscanos, capuchinhos, criadores de gado,
escravagistas, cangaceiros, coronéis, líderes messiânicos, corruptos e
assentados da reforma agrária.
Publicado em julho 16, 2012 por HC
http://www.ecodebate.com.br/2012/07/16/usina-nuclear-no-sertao-de-pernambuco-ameaca-indios-pankaras/
Tags: energia nuclear, indígenas, terras indígenas
A reportagem é de Leonencio Nossa e
publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 15-07-2012.
A história se repete. Tratores amarelos, mesma cor
das máquinas que derrubaram malocas antes do enchimento da reserva, em 1988,
cortaram a comunidade onde vivem 65 famílias para a abertura de uma estrada
estadual, construída com recursos federais. O susto maior foi quando os índios
receberam a notícia de que o caminho na caatinga levaria a uma usina nuclear.
O projeto de uma usina no semiárido nordestino
chegou a ser anunciado no ano passado pelo ministro de Minas e Energia, Edison
Lobão. A ideia está engavetada, pois não convenceu setores influentes do
governo e recebeu críticas pesadas de políticos e cientistas. Uma estrada,
porém, começou a ser aberta na terra dos pankarás para garantir o acesso a um
sítio, a 8 km das malocas, reservado para a usina.
‘Bomba‘
“No passado, eles tiraram a gente da beira do rio,
onde tinha água e peixe. A gente ficou na pedra”, lembra o índio Fernando
Antonio da Silva, de 65 anos, um dos mais antigos da tribo. “Só não é pior
que ficar ao lado da bomba. Se tiver problema, não vai dar tempo de correr.”
Os técnicos do governo espalharam no centro de Itacuruba
a versão de que serão criados, durante as obras, 4 mil empregos – e depois,
a usina, que “não é uma bomba”, trará finalmente o desenvolvimento da região.
Era uma notícia robusta para os habitantes de Itacuruba, Rodelas e
Petrolândia, cidades reconstruídas pela Companhia Hidrelétrica do São
Francisco, a Chesf, após a inundação da represa.
Os moradores da região saíram de uma economia de
subsistência, de pequenas criações e lavouras, para viver ao redor das
prefeituras e dos salários do funcionalismo público, em novos centros urbanos.
“O governo sabe tudo o que está ocorrendo”, diz, resignado, Jorge França,
de 40 anos, uma das novas lideranças dos pankarás. “Eles (os políticos) sempre
nos viram como pessoas que empatam o desenvolvimento do Brasil”, reclama a
cacique Lucélia Leal Cabral, de 34 anos. “Não ganhamos indenização em
1988 e não queremos agora. A tribo precisa apenas de paz para sobreviver.”
Até dezembro de 2002, os índios da região
utilizavam vários nomes e expressões para reafirmar sua distintividade étnica,
como “caboclo” e “braiado”. No começo de 2003, passaram a adotar o etnônimo Pankará
da Serra do Arapuá. Hoje, o povo indígena reúne quase 3 mil pessoas – a
Funai só tomou providências quanto ao reconhecimento territorial em 2005.
Lucélia não se opõe a obras de infraestrutura do governo,
mas critica a falta de diálogo com os índios e a ausência de compromisso para
garantir que a comunidade seja beneficiada.
(Ecodebate, 16/07/2012)
publicado pela IHU On-line, parceira
estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
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