quinta-feira, 10 de maio de 2012


SALVANDO O PLANETA NA ERA DOS HUMANOS, ARTIGO DE JOHN COLEMAN.

Publicado em março 13, 2012 por HC


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Abordar as questões ecológicas levantadas por Mark Lynas é “o” desafio global da nossa geração. Nenhum outro assunto tem tantas ramificações para a justiça, a paz e um futuro estável que permita o crescimento econômico.

A opinião é do jesuíta norte-americano John Coleman, ex-professor da cátedra Charles Casassa de Valores Sociais da Loyola Marymount University, na Califórnia, em artigo publicado no blog da revista America, dos jesuítas dos EUA, 08-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Eu tenho acompanhado cuidadosamente o trabalho de Mark Lynas sobre as questões ambientais há algum tempo. Lembro-me do seu livro de 2004, High Tide: The Truth About Our Climate Crisis [Maré alta: A verdade sobre a nossa crise climática], uma persuasiva justaposição de fotografias, incluindo uma foto que o pai de Lynas (geólogo) tirou de uma geleira no Peru no início da década de 1930 exibida ao lado de outra foto da mesma geleira em 2000. 40% da massa da geleira havia derretido.

Seu livro de 2008, Six Degrees: Our Future on a Hotter Planet [Seis graus: nosso futuro em um planeta mais quente] sistematicamente avaliou os impactos ambientais de um aumento de 1 a 6 graus Celsius nas temperaturas mundiais. O que tornou esse trabalho atrativo foi que ele não era apenas sobre especulação futura. No passado, a Terra passou por períodos semelhantes de aquecimento global. Não importa o que façamos, possivelmente veremos, no mínimo, um aumento de dois graus Celsius da temperatura global. Depois de três graus, chegaremos a um ponto de inflexão. Com um aumento de seis graus em um período anterior, 95% de todas as espécies foram extintas.

Em seu recente livro The God Species: Saving the Planet in the Age of Humans [As espécies de Deus: Salvando o planeta na era dos humanos] (Ed. National Geographic, 2011), Lynas segue atentamente o trabalho de um grupo de cientistas que se chamam de Grupo das Fronteiras Planetárias [Planetary Boundaries Group].

Esses cientistas estão tentando calcular as áreas de fronteira do perigo ecológico e – quando e na medida do possível – fazer algumas estimativas precisas sobre o que deve ser feito para enfrentá-las.

1. Biodiversidade

Eles listam nove áreas de fronteira. A primeira, a biodiversidade, se volta para a total extinção das espécies. Estamos enfrentando a mais extrema extinção de espécies em 65 milhões de anos. Atualmente, há um terço a menos de animais selvagens do que há apenas 40 anos! Um quarto dos mamíferos, um terço dos anfíbios, um quarto dos peixes de água doce e 13% das aves do mundo estão ameaçados.

Como observa Lynas, “uma diversidade saudável dos organismos vivos é essencial para que os ecossistemas funcionem adequadamente”. Uma pequena árvore em Bornéu tinha possibilitado a confecção de um poderoso medicamento anti-HIV. Infelizmente, depois, ela foi cortada e não existe mais. O Grupo das Fronteiras Planetárias observa que, em eras pré-industriais, as taxas de extinção eram de 1 por milhão de espécies por ano. Agora, elas são de 100 (ou, em algumas estimativas, 1.000) por ano. Eles sugerem um valor máximo de fronteira de 10 por milhão por ano.

2. Mudanças climáticas

Uma segunda fronteira envolve as mudanças climáticas, que agora registram 390 partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera (o grupo sugere uma meta de apenas 350 ppm). No início da Revolução Industrial, a taxa era de 280 ppm. Os perigos decorrem dos rápidos degelos dos tampões de gelo ártico, que irão levar a um aumento do nível do mar.

Como observa Lynas, no oeste da América do Norte, estamos vendo os seguintes sinais do aquecimento global: “Temperaturas altas; declínio da temporada de neve tardia; rotas de tempestades de inverno deslocadas para o Norte; aumento da intensidade das chuvas; piores secas desde que as medições começaram; quedas acentuadas do nível dos rios; mortalidade generalizada da vegetação; aumento acentuado da frequência de grandes incêndios”.

Todos esses sinais de perigo estão aumentando mais rapidamente do que a previsão de quaisquer modelos anteriores. Os pontos de inflexão irão afetar o degelo do Ártico e as placas de gelo da Groenlândia e impactar a Floresta Amazônica. O mais perigoso seria o derretimento do permafrost ártico, onde 1,5 trilhão de toneladas de dióxido de carbono jazem enterradas agora em uma piscina de coleta de carbono. A sua exposição à atmosfera seria verdadeiramente catastrófico. Segundo Lynas, “quanto mais esperarmos para lidar com a questão do carbono, mais cara será a solução”. Lynas rompe com grande parte da chamada comunidade verde ao apoiar o uso da energia nuclear para reduzir a produção de dióxido de carbono.

3. Nitrogênio

Uma terceira fronteira envolve o nitrogênio encontrado nos fertilizantes, que, por serem despejados nos rios, lagos e oceanos, provocam zonas mortas. O óxido nitroso tem que ser reduzido para cerca de um terço do seu uso atual. Novamente, Lynas não é um absolutista com relação ao uso de sementes geneticamente modificadas. Ele defende sementes que necessitem de menos nitrogênio e fertilizantes, e que possam, como mostrado por algumas sementes geneticamente modificadas, aumentar o rendimento da colheita. O Grupo das Fronteiras Planetárias propõe um limite para a quantidade de nitrogênio removido da atmosfera a cada ano em 35 milhões de toneladas. O valor atual é de 121.

4. Uso da terra

Uma quarta fronteira envolve o uso da terra. Precisamos conservar um certo número de “pontos quentes” ecológicos conhecidos pela sua biodiversidade. Reconhecer as implicações climáticas (para as chuvas) da perda de savanas e de florestas tropicais e, assim, preservá-las. Parte da perda de biodiversidade está relacionada ao uso da terra, porque as espécies passam fome por causa da perda de habitat e de suprimentos de comida adequados.

5. Água doce

A fronteira cinco refere-se à água doce. Rios, lagos, pântanos são o lar de mais de um quarto de todos os vertebrados conhecidos. Nós ainda não cruzamos a fronteira do uso da água por quilômetros cúbicos por ano proposto pelo Grupo das Fronteiras Planetárias (4.000 – atualmente, usamos 2.600).

6. Produtos tóxicos

A fronteira seis tem a ver com produtos tóxicos como DDT [dicloro-difenil-tricloroetano], PCBs [bifenilas policloradas], plásticos etc. Temos inúmeros exemplos de mortes de peixes e de aves decorrentes da ingestão de plásticos. Na Índia, o abutre-indiano-de-dorso-branco diminuiu 99,9% entre 1992 e 2007 por causa do uso generalizado de uma droga anti-inflamatória, o dictofenaco, na criação de animais de cujos corpos em decomposição os abutres se alimentam.

7. Aerossóis

A fronteira sete envolve os aerossóis. O carbono negro, também, que vem de fornos sujos dos países do Terceiro Mundo, levou a placas de neve mais escuras (que, então, não refletem a luz do Sol para longe da Terra).

8. Acidificação dos oceanos

A fronteira oito, a acidificação dos oceanos, é muito importante. 85% de todo o carbono consumido desde a Revolução Industrial foi absorvido pelos oceanos, que servem como sumidouros de carbono. Mas, como resultado, os oceanos agora têm menos capacidade para absorver mais carbono e sofreram acidificação extrema. Um aumento de 30% da acidez nos nossos mares ameaça os recifes de coral, os frutos do mar com conchas (e, assim, os pássaros que dependem desses peixes para se alimentarem).

Como argumenta Lynas, mesmo que os níveis elevados de dióxido de carbono não tenham causado o aquecimento global, seu impacto sobre a acidez dos oceanos é, em si mesmo, uma ameaça grande o suficiente para afetar o nível de dióxido de carbono na nossa atmosfera.

9. Ozônio

A fronteira final tem a ver com as camadas de ozônio e o impacto de clorofluorocarbonos (CFCs) ao causar buracos na camada de ozônio. Felizmente, desde o Protocolo de Montreal de 1987, a comunidade internacional tem enfrentado essa questão, e a quantidade de CFCs na atmosfera reduziu drasticamente.

Lynas não acredita que qualquer argumento que seja totalmente pessimista terá muito impacto. Nem uma mensagem principalmente de austeridade e de sacrifício ou de não crescimento. Ele não é um absolutista na questão da energia nuclear, da engenharia genética (até mesmo, em um caso extremo, de projetos de geoengenharia para atenuar o impacto do Sol sobre a nossa atmosfera, se isso for necessário para ganhar tempo para enfrentar o aquecimento global).

Ele também sabe que, se o argumento se transforma em um embate economia versus ambiente, a economia quase sempre irá ganhar. Mas ele sente que há enormes benefícios econômicos (para a criação de empregos, para a redução dos custos energéticos) em apostar no verde.

Como se sabe, Lynas atuou como assessor para mudanças climáticas do presidente Mohamed Nasheed, das Maldivas. Como tal, ele participou da cúpula climática de Copenhague. Um documentário sobre Nasheed e a ameaça da elevação do nível dos mares de inundar as Maldivas, The Island President (theislandpresident.com), está atualmente em exibição nos cinema [dos EUA].

Seguindo o Papa Bento XVI, estou convencido de que abordar as questões ecológicas levantadas por Lynas é “o” desafio global da nossa geração. Nenhum outro assunto tem tantas ramificações para a justiça, a paz e um futuro estável que permita o crescimento econômico.

(Ecodebate, 13/03/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.

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