SALVANDO O PLANETA NA ERA DOS HUMANOS, ARTIGO DE
JOHN COLEMAN.
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Abordar
as questões ecológicas levantadas por Mark Lynas é
“o” desafio global da nossa geração. Nenhum outro assunto tem tantas
ramificações para a justiça, a paz e um futuro estável que permita o
crescimento econômico.
A
opinião é do jesuíta norte-americano John Coleman,
ex-professor da cátedra Charles
Casassa de Valores Sociais da Loyola Marymount University, na Califórnia,
em artigo publicado no blog da revista America,
dos jesuítas dos EUA, 08-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Eu
tenho acompanhado cuidadosamente o trabalho de Mark Lynas
sobre as questões ambientais há algum
tempo. Lembro-me do seu livro de 2004, High Tide: The Truth About Our Climate Crisis [Maré alta: A verdade sobre a nossa crise
climática], uma persuasiva justaposição de fotografias, incluindo uma foto que
o pai de Lynas (geólogo) tirou de uma geleira no Peru no início da década de
1930 exibida ao lado de outra foto da mesma geleira em 2000. 40% da massa da
geleira havia derretido.
Seu
livro de 2008, Six
Degrees: Our Future on a Hotter Planet [Seis
graus: nosso futuro em um planeta mais quente] sistematicamente avaliou os
impactos ambientais de um aumento de 1 a 6 graus Celsius nas temperaturas
mundiais. O que tornou esse trabalho atrativo foi que ele não era apenas sobre
especulação futura. No passado, a Terra passou por períodos semelhantes de aquecimento
global. Não importa o que façamos, possivelmente veremos, no mínimo, um aumento
de dois graus Celsius da temperatura global. Depois de três graus, chegaremos a
um ponto de inflexão. Com um aumento de seis graus em um período anterior, 95%
de todas as espécies foram extintas.
Em
seu recente livro The
God Species: Saving the Planet in the Age of Humans [As espécies de Deus: Salvando o planeta na era
dos humanos] (Ed. National Geographic, 2011), Lynas segue
atentamente o trabalho de um grupo de cientistas que se chamam de Grupo das Fronteiras Planetárias [Planetary Boundaries Group].
Esses cientistas estão tentando calcular as áreas de fronteira do perigo ecológico e – quando e na medida do possível – fazer algumas estimativas precisas sobre o que deve ser feito para enfrentá-las.
1. Biodiversidade
Eles
listam nove áreas de fronteira. A primeira, a biodiversidade, se volta para a
total extinção das espécies. Estamos enfrentando a mais extrema extinção de
espécies em 65 milhões de anos. Atualmente, há um terço a menos de animais
selvagens do que há apenas 40 anos! Um quarto dos mamíferos, um terço dos
anfíbios, um quarto dos peixes de água doce e 13% das aves do mundo estão
ameaçados.
Como
observa Lynas, “uma diversidade saudável dos organismos vivos é
essencial para que os ecossistemas funcionem adequadamente”. Uma pequena árvore
em Bornéu tinha possibilitado a confecção de um poderoso
medicamento anti-HIV. Infelizmente, depois, ela foi cortada e não existe mais.
O Grupo das
Fronteiras Planetárias observa que, em
eras pré-industriais, as taxas de extinção eram de 1 por milhão de espécies por
ano. Agora, elas são de 100 (ou, em algumas estimativas, 1.000) por ano. Eles
sugerem um valor máximo de fronteira de 10 por milhão por ano.
2. Mudanças climáticas
Uma
segunda fronteira envolve as mudanças climáticas, que agora registram 390
partes por milhão de dióxido de carbono na atmosfera (o grupo sugere uma meta
de apenas 350 ppm). No início da Revolução Industrial, a taxa era de 280 ppm. Os perigos decorrem dos rápidos
degelos dos tampões de gelo ártico, que irão levar a um aumento do nível do
mar.
Como
observa Lynas, no oeste da América do Norte,
estamos vendo os seguintes sinais do aquecimento global: “Temperaturas altas;
declínio da temporada de neve tardia; rotas de tempestades de inverno
deslocadas para o Norte; aumento da intensidade das chuvas; piores secas desde
que as medições começaram; quedas acentuadas do nível dos rios; mortalidade
generalizada da vegetação; aumento acentuado da frequência de grandes incêndios”.
Todos
esses sinais de perigo estão aumentando mais rapidamente do que a previsão de
quaisquer modelos anteriores. Os pontos de inflexão irão afetar o degelo do Ártico e as placas de gelo da Groenlândia e impactar a Floresta Amazônica. O mais perigoso seria o derretimento do
permafrost ártico, onde 1,5 trilhão de toneladas de dióxido de carbono jazem
enterradas agora em uma piscina de coleta de carbono. A sua exposição à
atmosfera seria verdadeiramente catastrófico. Segundo Lynas, “quanto mais esperarmos para lidar com a questão
do carbono, mais cara será a solução”. Lynas rompe com grande parte da chamada
comunidade verde ao apoiar o uso da energia nuclear para reduzir a produção de
dióxido de carbono.
3. Nitrogênio
Uma
terceira fronteira envolve o nitrogênio encontrado nos fertilizantes, que, por
serem despejados nos rios, lagos e oceanos, provocam zonas mortas. O óxido
nitroso tem que ser reduzido para cerca de um terço do seu uso atual.
Novamente, Lynas
não é um absolutista com relação ao
uso de sementes geneticamente modificadas. Ele defende sementes que necessitem
de menos nitrogênio e fertilizantes, e que possam, como mostrado por algumas
sementes geneticamente modificadas, aumentar o rendimento da colheita. O Grupo das Fronteiras Planetárias propõe um limite para a quantidade de nitrogênio
removido da atmosfera a cada ano em 35 milhões de toneladas. O valor atual é de
121.
4. Uso da terra
Uma
quarta fronteira envolve o uso da terra. Precisamos conservar um certo número
de “pontos quentes” ecológicos conhecidos pela sua biodiversidade. Reconhecer
as implicações climáticas (para as chuvas) da perda de savanas e de florestas
tropicais e, assim, preservá-las. Parte da perda de biodiversidade está
relacionada ao uso da terra, porque as espécies passam fome por causa da perda
de habitat e de suprimentos de comida adequados.
5. Água doce
A
fronteira cinco refere-se à água doce. Rios, lagos, pântanos são o lar de mais
de um quarto de todos os vertebrados conhecidos. Nós ainda não cruzamos a
fronteira do uso da água por quilômetros cúbicos por ano proposto pelo Grupo das Fronteiras Planetárias (4.000 – atualmente, usamos 2.600).
6. Produtos tóxicos
A
fronteira seis tem a ver com produtos tóxicos como DDT [dicloro-difenil-tricloroetano], PCBs [bifenilas policloradas], plásticos etc. Temos
inúmeros exemplos de mortes de peixes e de aves decorrentes da ingestão de
plásticos. Na Índia, o abutre-indiano-de-dorso-branco diminuiu 99,9%
entre 1992 e 2007 por causa do uso generalizado de uma droga anti-inflamatória,
o dictofenaco, na criação de animais de cujos corpos em
decomposição os abutres se alimentam.
7. Aerossóis
A
fronteira sete envolve os aerossóis. O carbono negro, também, que vem de fornos
sujos dos países do Terceiro
Mundo, levou a placas de neve mais escuras
(que, então, não refletem a luz do Sol para longe da Terra).
8. Acidificação dos oceanos
A
fronteira oito, a acidificação dos oceanos, é muito importante. 85% de todo o
carbono consumido desde a Revolução
Industrial foi absorvido pelos oceanos, que
servem como sumidouros de carbono. Mas, como resultado, os oceanos agora têm
menos capacidade para absorver mais carbono e sofreram acidificação extrema. Um
aumento de 30% da acidez nos nossos mares ameaça os recifes de coral, os frutos
do mar com conchas (e, assim, os pássaros que dependem desses peixes para se
alimentarem).
Como
argumenta Lynas, mesmo que os níveis elevados de dióxido de
carbono não tenham causado o aquecimento global, seu impacto sobre a acidez dos
oceanos é, em si mesmo, uma ameaça grande o suficiente para afetar o nível de
dióxido de carbono na nossa atmosfera.
9. Ozônio
9. Ozônio
A
fronteira final tem a ver com as camadas de ozônio e o impacto de clorofluorocarbonos (CFCs) ao causar buracos na camada de ozônio. Felizmente,
desde o Protocolo
de Montreal de 1987, a comunidade internacional
tem enfrentado essa questão, e a quantidade de CFCs na atmosfera reduziu
drasticamente.
Lynas não acredita que qualquer argumento que seja
totalmente pessimista terá muito impacto. Nem uma mensagem principalmente de
austeridade e de sacrifício ou de não crescimento. Ele não é um absolutista na
questão da energia nuclear, da engenharia genética (até mesmo, em um caso
extremo, de projetos de geoengenharia para atenuar o impacto do Sol sobre
a nossa atmosfera, se isso for necessário para ganhar tempo para enfrentar o
aquecimento global).
Ele
também sabe que, se o argumento se transforma em um embate economia versus
ambiente, a economia quase sempre irá ganhar. Mas ele sente que há enormes
benefícios econômicos (para a criação de empregos, para a redução dos custos
energéticos) em apostar no verde.
Como
se sabe, Lynas
atuou como assessor para mudanças
climáticas do presidente Mohamed
Nasheed, das Maldivas. Como tal, ele participou da cúpula climática de Copenhague. Um documentário sobre Nasheed e a
ameaça da elevação do nível dos mares de inundar as Maldivas, The Island President (theislandpresident.com), está atualmente em exibição nos cinema [dos
EUA].
Seguindo
o Papa Bento XVI, estou convencido de que abordar as questões
ecológicas levantadas por Lynas
é “o” desafio global da nossa
geração. Nenhum outro assunto tem tantas ramificações para a justiça, a paz e
um futuro estável que permita o crescimento econômico.
(Ecodebate, 13/03/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização
da informação.
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