Conferência Ethos: Mecanismos anticorrupção, um desafio para a Rio+20.
Delia Rubio (foto), da
Transparência Internacional, teme que a falta de compromissos na Rio+20 se
transforme em risco para as “finanças climáticas”.
28/05/2012
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“A Rio+20 oferece uma oportunidade sem
precedentes para definir a agenda para o desenvolvimento sustentável. No
entanto, se essa agenda não incluir mecanismos de combate à corrupção, o grande
volume de recursos financeiros canalizados no processo pode criar ainda mais
incentivos para a corrupção e o esgotamento dos recursos.” O alerta é da
advogada argentina Delia Ferreira Rubio, membro do Conselho Internacional da
Transparência Internacional e uma das palestrantes da Conferência Ethos
Internacional 2012, que ocorre em São Paulo, de 11 a 13 de junho, com o tema
geral “A Empresa e a Nova Economia. O que muda com a Rio+20?”.
Doutora em direito e consultora de inúmeras
instituições internacionais, como a Organização de Estados Americanos (OEA) –
onde atua no Programa de Educação em Valores Democráticos e Formação de
Lideranças –, Delia Rubio afirma que mecanismos de transparência e prestação de
contas são vitais para o dinheiro chegar onde é mais necessário: “A corrupção é
uma séria ameaça à sustentabilidade. Ela mina realizações voltadas à redução da
pobreza e ao crescimento da economia verde e é um dos principais entraves ao
cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Baixos níveis de
transparência, responsabilidade e integridade estão empiricamente
correlacionados com menor número de alunos alfabetizados, maiores índices de
mortalidade materna e maior dificuldade no acesso à água potável”.
Segundo Delia, com o crescimento populacional e a
expansão do consumo acelerando a competição pelos recursos escassos do planeta,
aumentam as tensões sociais e também a probabilidade de corrupção. “Décadas de
experiência colaborando com o desenvolvimento nos ensinaram que salvaguardas
anticorrupção não devem se constituir numa reflexão tardia. Elas precisam ser
inscritas no projeto de desenvolvimento e processos sustentáveis agora,
enquanto esses mecanismos ainda estão tomando forma. É por isso que a prevenção
da corrupção deve ser uma parte integrante da Rio+20”, argumenta.
Governança, questão central
Na visão da especialista, para assegurar que os
resultados do desenvolvimento sustentável sejam alcançados, o acordo deve
abordar explicitamente formas de fortalecer a governança em todos os níveis
(local, nacional e global). Deve também consagrar mecanismos que promovam a
transparência e a responsabilidade, bem como a conduta ética, “na política e na
prática”, por parte de todos os interessados (governos, empresas e sociedade
civil).
Delia Rubio alerta para duas questões críticas
ausentes do texto em negociação para o documento final da Rio+20: a prevenção à
corrupção e o enfrentamento aos riscos associados ao que ela define como
“finanças climáticas” – os fundos que serão criados para a adaptação às
mudanças climáticas e sua mitigação.
“Se não trabalharmos a governança, não haverá
desenvolvimento sustentável verdadeiro. Mecanismos de controle e de prestação
de contas que permitam o acesso à informação e a participação da sociedade em
relação ao uso racional dos recursos públicos são a única forma de conseguir
garantir, desde o começo, que o dinheiro não vá parar nos bolsos de protegidos
e chegue onde é mais necessário”, afirma.
A representante da Transparência Internacional
ressalta a importância da Conferência Ethos, especialmente por reunir um número
significativo de empresas e coligações do setor privado: “Dessa forma,
aumentamos nosso poder coletivo e ganhamos voz para defender um futuro global
justo e sustentável, que vá além do crescimento do PIB”.
Como resultado, ela espera um sólido conjunto de
políticas e recomendações que possam ser inspiradoras para a Rio+20. Admite, no
entanto, que suas expectativas são “mistas”: ao mesmo tempo que enxerga a
Conferência Ethos como “um passo significativo”, não tem esperanças de grandes
avanços na Rio+20. “Acho que a cúpula da ONU tende a produzir acordos com o
menor denominador comum possível – o que geralmente significa compromissos
fracos ou a falta de compromissos em termos de transparência e
responsabilidade”, opina.
Vontade do cidadão
A advogada afirma que a luta anticorrupção leva
muitos anos e que, embora o tema faça parte da agenda de muitos governos, a
solução do problema depende da vontade do cidadão comum. “Ela virá apenas
quando houver demanda por transparência da cidadania. Nosso grande desafio é
incorporar o cidadão comum a essa luta”, ressalta.
Delia Rubio afirma que isso só vai acontecer
quando a população entender que a corrupção não envolve só políticos,
traficantes e maus empresários, mas afeta a saúde, a educação, os serviços
públicos e a qualidade de vida. “Quando o cidadão comum conseguir fazer essa
ligação, de que ele é a grande vítima, o maior afetado pelas consequências da
corrupção – seja pelo medicamento falsificado ou vencido, seja pela parede da
escola que desabou porque foi feita com material inadequado –, então teremos
mais gente lutando contra isso”, explica.
Brasil exemplar
A demanda por transparência vem aumentando em
todo o mundo, segundo a especialista, que cita o Brasil como exemplo de avanço
nessa área: “A informação é insumo fundamental para a tarefa de um Congresso
sério. Tanto para legislar como para controlar, é indispensável contar com
informação suficiente, verídica e atualizada. Há uma tendência mundial de
demanda por abertura e transparência, que vem sendo liderada pelo Brasil e
pelos Estados Unidos. Estamos muito atentos à política da presidenta Dilma
Rousseff, uma mulher com posição firme, cuja linha de conduta tem demonstrado
que transparência e ética pública são princípios não negociáveis”, diz.
A iniciativa de governo aberto, copatrocinada por
Brasil e Estados Unidos, com o lançamento de iniciativas que facilitam o acesso
à informação pública, vem sendo seguida por outros países. “Ao contrário do que
muitos governantes pensam, o controle do Estado não é feito para molestar os
governos. A exigência de ética pública, de informes ao parlamento e de
prestação de contas é uma forma de garantir os direitos das pessoas que os
governantes representam. Nós, cidadãos, que demos a eles um contrato para que
governem por nós durante um período, temos de saber quais são nossos direitos,
quais as regras para chegar a determinado posto, obter um benefício ou entrar
numa concorrência. Quando todos podem ler os requisitos, terminam as
arbitrariedades na tomada de decisões ”, argumenta.
De acordo com um ranking elaborado a cada dois
anos pela Transparência Internacional – chamado Índice de Percepção de
Corrupção –, El Salvador, Argentina, Venezuela, Guatemala e Paraguai são os
países latinos com pior desempenho. Entre os 183 países pesquisados em 2011, o
Brasil ocupava o posto 73, com 3,8 pontos. O primeiro colocado era a Nova
Zelândia, seguida da Finlândia e da Dinamarca – as três com 9,5 de nota (o
máximo é 10). Somália e Coréia do Norte, as últimas colocadas, tiveram 1 ponto.
“Creio que, na América Latina, nem todos os
países estão no mesmo nível de avanço. Alguns avançaram na criação de
institutos e colocaram em marcha políticas públicas, mas em outros fazem falta
algumas leis que garantam maior transparência. O Brasil avançou em matéria de
transparência no financiamento da política com a lei que obriga os candidatos a
reportarem a origem dos fundos da campanha eleitoral”, analisa.
Falta dinamizar a justiça
Segundo ela, ainda há muito a fazer: “A justiça é
lenta e não muito independente. As pessoas ficam desiludidas com isso, porque
um escândalo é descoberto, os jornais dão visibilidade à história, mas um novo
escândalo se sobrepõe a ele, passa o tempo, as causas prescrevem e nada
acontece. Fazem falta códigos processuais adequados e uma justiça independente
do poder político, com recursos orçamentários e humanos suficientes e
capacidade de investigar”, esclarece. Informa ainda que, atualmente, o crime
organizado é o grande desafio transnacional, “algo distinto do risco de
corrupção, mas muito grave, porque vem comprando decisões e proteção. Seu
combate requer trabalho coordenado entre inúmeros países”.
Delia Rubio afirma que a Transparência
Internacional sempre acreditou na união de forças em torno de uma causa e por
isso elogia a iniciativa do Instituto Ethos de promover “alianças de diferentes
atores”. Ela qualifica a atuação conjunta “com uma abordagem integrada e
construtiva” como “mais eficiente” no combate à corrupção: “É por isso que nós
trabalhamos com parceiros nos negócios, no governo e na sociedade civil para o
desenvolvimento e a implementação de medidas eficazes”.
Para que a corrupção não prejudique os objetivos
de desenvolvimento sustentável, a advogada defende uma fiscalização construída
com iniciativas inter-relacionadas. “Ter o setor privado como parte da solução
é a única maneira de podermos avançar para a justiça social real”, conclui,
convidando todos os interessados no tema a participar da 15 ª Conferência
Internacional de Combate à Corrupção, que acontecerá no Brasil, em novembro
próximo: “Virão mais de 1.500 pessoas de vários países e setores para discutir,
entre outros assuntos, os resultados de Rio+20”.
Para fazer sua inscrição na Conferência Ethos Internacional 2012, clique aqui.
Instituto Ethos/EcoAgência
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