III
ENCONTRO POPULAR DA BACIA DO SÃO FRANCISCO.
CARTA DE
JANUÁRIA - “Por uma revitalização popular”
Nós,
indígenas, quilombolas, comunidades de fundo e fechos de pasto, pescadores,
ribeirinhos, geraizeiros, comunicadores populares, pastorais, ONGs,
representantes do povo do rio São Francisco, reunidos entre os dias 25 a 27 de
maio de 2012, em Januária/MG, constatamos a triste e repetitiva situação de
nosso rio e dos povos que lhe pertencem, mas também as resistências, lutas e
esperanças populares.
A
revitalização do governo não anda. Os investimentos em saneamento existem, mas
é impossível ver resultados concretos. Não há controle sobre as obras, não há
transparência. Em termos de ação governamental é a única iniciativa da
propalada revitalização em toda a bacia.
A
degradação continua em nível crescente.
O despejo incessante de agrotóxicos e esgotos sem tratamento; o
desmatamento e o assoreamento do leito dos afluentes e do próprio rio; o uso
abusivo de suas águas por empresas ligadas ao ramo do agro e hidro negócio e da
mineração; os grandes projetos de irrigação para monoculturas de exportação e a
exploração do setor elétrico só vêm a agravar o imenso passivo socioambiental
que historicamente se acumulou na bacia.
Há uma
resistência heroica de várias comunidades para “resistir e existir” em seu
lugar, mas continua a expropriação de terras e territórios dos povos que
tradicionalmente ocupam a bacia, contra os quais persistem as ações violentas
de despejo, perseguição, criminalização e assassinatos, bem como o descaso e a
lentidão nas ações de demarcação e titulação dos territórios. Por outro lado,
têm-se a cessão ilegal desses territórios para domínio de grandes empresas e
implantação de atividades que exploram os bens naturais de forma criminosa e
ainda impedem o acesso à terra, às águas e aos peixes do rio. Todas são
práticas que ameaçam a existência físico-cultural de muitas das comunidades do
São Francisco.
Persistem
a ausência de políticas públicas apropriadas ao semiárido e ao cerrado
brasileiros e a recorrência de fenômenos naturais como a seca, onde o governo
ainda se vale de ações emergenciais e assistencialistas que acabam por
sustentar os interesses político-econômicos da “indústria da seca”, sobretudo
em anos eleitorais como esse. No mesmo sentido, a opção equivocada pelas
grandes obras hídricas, como a transposição de águas do rio São Francisco, cujo
atual estado das obras e superfaturamento dos contratos só vêm a comprovar as
denúncias realizadas por tantos que se contrapuseram ao projeto. O que temos de
positivo no semiárido são as iniciativas da sociedade civil na lógica da
convivência com o semiárido.
O São
Francisco é um rio dos cerrados mineiro e baiano, responsáveis pela quase
totalidade de suas águas. A expansão do agronegócio, das hidrelétricas e das
mineradoras nestas regiões tem acelerado violentamente a depredação dos bens
naturais e culturais destes cerrados. Passa da hora a aprovação das Propostas
de Emenda Constituições - PECs que tornam patrimônios nacionais o cerrado e
outros biomas e criam fundos públicos para sua preservação. Não há saída sem
restringir e submeter a ação do capital sobre a natureza e os povos.
Repudiamos
as políticas de intervenção no Rio São Francisco previstas em planos atuais e
futuros do governo federal, como a proposta de implementação de usinas nucleares
- a exemplo da usina no município de Itacuruba (PE)-, a implementação de
parques eólicos por meios que agridem as comunidades e o ambiente, a expansão
das atividades de mineração e dos grandes projetos de irrigação; a proposta de
emenda constitucional 215 e a ameaça de revogação do Decreto 4887/03, objeto de
manobras da bancada ruralista e que ameaçam a efetivação dos direitos
territoriais das comunidades tradicionais, significando imenso retrocesso
democrático no nosso país.
Vimos
aqui mesmo em Januária e na vizinha São João das Missões experiências
significativas de revitalização popular do Rio dos Cochos e do território
reconquistado pelo Xacriabás, respectivamente. Nossos povos têm iniciativas que
precisam ser consideradas e valorizadas na revitalização do rio São Francisco.
Basta que aqueles que governam tenham olhos para ver. São estas experiências as
estrelas que guiam nossos passos. Continuamos a fluir com as águas do nosso
rio. Parar, jamais. Nosso destino é o oceano da justiça, da solidariedade e da
paz.
São
Francisco Vivo, terra, água, rio e povo!
Januária
27 de maio de 2012.
Colônia
de Pescadores Z-026, Pescadores do Baixio de Irecê, Rizicultores de Sergipe,
Comissão Pastoral da Terra BA/MG/Nacional,Conselho Indigenista Missionário
PE/MG, Conselho Pastoral dos Pescadores Nacional/ BA, Associação de Fundo e
Fecho de Pasto, Povo Pankará, Povo Xacriabá, IRPAA (Instituto Regional da
Pequena Agropecuária Apropriada), AATR (Associação de Advogados de
Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia), CETA/BA, SINDSERV/SE, SINTAGRO/BA,
STR Porteirinha, STR B. Jesus da Lapa,EFA Guimarães Rosa, Cáritas Diocesana de
Januária, Movimento pelas Serras e Águas de Minas, Diocese de Floresta, Diocese
de Bom Jesus da Lapa, Comitê da Bacia Hidrográfica do rio Salitre, Associação
Quilombola de Brejo dos Crioulos (MG), Associação Quilombola de Brejões dos
Negros (SE), Associação Quilombola de Barra do Parateca (BA), CADAESF, Assent.
17 de abril,MPA/SE, Escola de Fé e Política,ACOMA
Ingrid
Campos
Articulação
Popular do São Francisco - Assessoria de Comunicação
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Fonte para edição no Rema:
Manoel Bomfim Ribeiro - manoel.bomfim@terra.com.br
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