Jornal O POVO, de Fortaleza, publica especial
sobre seca
A edição deste domingo, 11, do O
POVO traz o especial Planeta Seca. Uma grande reportagem, em 16 páginas, sobre
a estiagem de 2012 que tomou conta de 178 municípios cearenses.
O documento atualiza a discussão sobre um
recorrente fenômeno natural que faz parte do dia a dia de quem mora no
semiárido brasileiro. Mais presente do que a ocorrência das chuvas.
Configuração
Dizer que não há uma nova configuração de
cenários do Interior do Nordeste é ser injusto. Mas a a falta de políticas
permanentes e de transferência de renda, assim como insegurança alimentar e a
insustentabilidade hídrica ainda fazem padecer pelo menos 1 milhão e 800 mil
pessoas. Fora os animais silvestres e os rebanhos bovino, caprino e ovino.
Repórteres do O POVO percorreram
mais de 2 mil quilômetros entre as quatro regiões mais devastadas pela seca
deste ano. Os signos que compõem o imaginário em torno da estiagem são os
mesmo, porém as estratégias que vêm sendo implantadas pedem mais complexidade
na observação.
COMENTÁRIOS
Cássio Borges - Engenheiro aposentado do
DNOCS
Caros amigos
Envio-lhes esta matéria publicada, domingo, dia
11, no Jornal O Povo, de Fortaleza intitulada Planeta Seca. O que me causa
indignação é que se passaram anos a fio com muito blá-blá-blá dos “salvadores
da pátria” com fórmulas mirabolantes que somente agora neste ano de 2012 se
desnuda com este horripilante quadro da realidade nordestina que não se pode
mais esconder. Estão a olhos vistos, como mostra esta reportagem do referido
Jornal. Obras como o Açude Castanhão, o Canal da Integração e a propalada
Gestão das Águas incrementada pela COGERH eram apontadas como solução
definitiva para o secular problema das secas no Estado do Ceará. Falou-se em
mais de duas dezenas de anos no Canal do Rio São Francisco mas este até agora
ficou só nas promessas. Suas obras, atualmente, estão praticamente paralisadas.
O Eixo Leste, com 48% e o Eixo Norte, com apenas 19%. Outras obras vão sendo
prometidas e esquecidas ao longo do tempo como os “anéis da água”, o “caminho
das águas”, a “interligação de bacias”, o “cinturão das águas”, a“mistura de
rios” que são expressões românticas que nos induzem a pensar no bonito e no
belo.
Nunca se sofismou tanto em matéria de recursos
hídricos no Ceará como nestes últimos vinte anos. Pelo que se ouve e se lê na
imprensa local, o Estado do Ceará atingiu o“apogeu” da tecnologia no trato da
questão da água em regiões semiáridas. Tudo está absolutamente equacionado e
sob o mais absoluto controle. O DNOCS já cumpriu o seu papel, dizem os seus
mais ferrenhos opositores: “é um órgão muito velho, portanto deve ser extinto”,
como afirmou o atual ministro Fernando Bezerra. Mas não é só ele que faz este
tipo de afirmação. Em Brasília há uma corrente que, há anos, alimenta este
pensamento e advoga a extinção do DNOCS por inanição. E ele já foi extinto em
1999 pelo então presidente FHC. Para que o DNOCS se aqui no Ceará existe a
COGERH que, diga-se de passagem, ocupa todos os espaços que a mídia lhe oferece
para fazer propaganda institucional em torno dela? Com isso, sem dominar um
assunto tão complexo e nem conhecer a realidade (o DNOCS simplesmente se
omite), a sociedade pode ser induzida a considerar que o DNOCS pode, realmente,
ser dispensado. É uma pura questão de “marketing” que merece, no mínimo, uma
discussão.
Segundo os idealizadores desse modelo de gestão
dos recursos hídricos (com o Açude Castanhão, Canal da Integração, etc.) não
haverá mais seca e nem faltar água em qualquer ponto do sertão cearense. No
caso do Projeto de Integração do Rio São Francisco, perdeu-se mais de vinte
anos discutindo-se qual a vazão que deveria ser retirada daquele manancial para
a região setentrional do nordeste brasileiro. Se tivessem acatado a minha
proposta de 50 m3/s a obra já poderia estar concluída. Felizmente, graças ao
ex-ministro Ciro Gomes, o projeto definitivo foi reduzido a 26 m3/s e,
excepcionalmente, pra 127 m3/s quando a Barragem de Sobradinho estiver com 90%
de sua capacidade. Esta última hipótese me parece pouco provável haja vista que
na atual seca que assola toda a região nordestina, a Barragem de Sobradinho
está com apenas 24% de sua capacidade total de acumulação. Provavelmente quando
ela estiver cheia, aqui, também, deveremos ter chuvas abundantes não
necessitando, portanto, de aporte de água de outra região. Com 50 m3/s a obra
teria uma custo de implantação e manutenção evidentemente muito menor.
Já que falamos no Açude Castanhão, o mesmo foi
construído para acumular 6, 7 bilhões de m3 de água. Eu o defendia com uma
capacidade de 1,2 bilhão de m3 que, inclusive evitaria a inundação da cidade de
Jaguaribara. Em contrapartida, o Açude Aurora seria construído no Rio Salgado
com 800 milhões de m3. Esta minha proposta, lamentavelmente, também não foi
aceita. O Rio Salgado continua sem controle. Vendo o quadro da Situação dos
Açudes Públicos Construídos pelo DNOCS, elaborado, diariamente, por uma equipe
constituída de dois engenheiros e de dois auxiliares daquele Departamento
Federal, observa-se que o Açude Castanhão, em 31 de outubro p. passado, estava
com uma acumulação superior a sua capacidade de regularização (cota 100m) que é
de 4,5 milhões de m3. Ele estava, portanto, cheio, com 4,9 bilhões de m3.
Enquanto isto, o Açude Orós estava com 88,12% de sua acumulação total que é de
2,0 bilhões de m3. Como se sabe, ambos reservatórios foram construídos no leito
principal do Rio Jaguaribe distando um do outro em apenas 150 quilômetros,
aproximadamente. Dessa situação, se vocês me permitirem, tiro a seguinte
conclusão: O Açude Orós perdeu a sua finalidade. Hoje é um mero repassador de
vazões para o Açude Castanhão, como que estivesse servindo apenas para
compensar a evaporação deste.
Ao concluir este desabafo, que peço desculpas aos
meus web-leitores, só gostaria de lembrar a construção da Adutora do Oeste no
sertão pernambucano, projetada e construída pelo DNOCS, transportando do Rio
São Francisco uma vazão de apena 1 m3/s (eu disse, hum metro cúbico por
segundo) atendendo a 41 municípios (cidades, vilas e povoados). Portanto, para
se“conviver” com a seca não é preciso obras miraculantes como é o caso do Açude
Castanhão e o Canal da Integração que foi projetado e está sendo concluído para
transportar 26 m3/s. Até o ano passado tudo parecia que o setor de
abastecimento de água no Estado do Ceará estava muito bem. A seca deste ano de
2012 veio mostrar a face cruel de uma realidade que se procurava esconder, ou
ignorar, ou iludir-se e cobrar das autoridades o seu alto preço pela
imprevidência. Cássio
P.S. – Posteriormente, vou explicar porque a
Usina de Belo Monte que está sendo construída no Rio Xingu, no Pará, tem tudo a
ver com a solução da problemática da seca na região nordestina.
João Suassuna - Pesquisador da Fundação
Joaquim Nabuco, Recife.
Na minha humilde avaliação, a ficha do Dr. Cássio
Borges, ferrenho defensor da transposição do rio São Francisco, só caiu agora.
Demasiadamente tarde!
João Bosco Carbogim - Presidente da
Fundação Brasil Cidadão, Fortaleza
Olá, João, bom dia. Vi ontem a matéria em questão e li o desabafo do Borges.
É a tragédia dos comuns mais uma
vez acontecendo. O dinheiro? O gato comeu...
Agora, lamentável é que os caras
andam 2 mil km, ressuscitam aquela imagem
do Nordetes pedinte, vítima das
secas secas, das secas verdes, das secas sem vergonha,
as secas políticas e,
simplesmente, se "esquecem" de "ambientalizar" o assunto.
A falta dágua é só uma
consequência. Enfim, essas tragédias anunciadas, enquanto
o meio ambiente não for levado a
sério, continuarão seu eterno ciclo. E os "comuns"
pagando a conta.
Que pena gastar tanto papel pra
se lamentar. João Bosco Carbogim
Nenhum comentário:
Postar um comentário