Manelito Vilar falando do gado Sindi.
Para quem ainda não leu,
reeditamos a matéria da entrevista do criador Manelito Vilar concedida a
Revista da ABCZ no ano de 2004, destacando os trechos onde o Sindi é o assunto.
Nesta época, o Sindi deixava os currais das fazendas e começava a sua caminhada
rumo ao lugar de destaque que hoje ocupa em nossa pecuária, fato marcado pela
realização da 1ª Exposição Nacional Sindi e do seu primero leilão nacional.
Vale a pena reler, refletir e por em prática os ensinamentos do grande
sertanejo, autêntico e original criador de gados, de sonhos e de resultados.
http://sindidorn.blogspot.com.br/2010/11/manelito-vilar-falando-de-sindi.html?spref=fb
”Som
ente
um sertanejo legítimo, que aposta na pecuária como a melhor maneira para
viabilizar uma vida digna ao povo do sertão, poderia falar com propriedade
sobre a importância do gado zebuíno para o desenvolvimento do Nordeste
brasileiro. É devido às raízes do sertão, que o criador e engenheiro Manoel
Dantas Vilar Filho, procura manter-se fiel às possibilidades que a terra do
Nordeste oferece a quem se dispõe a respeitá-las, conservando suas
características naturais.
Ele alia qualidade e altos índices de
produção em uma região onde as dificuldades climáticas poderiam ser um
empecilho a qualquer tipo de atividade agropecuária. Entusiasta e criador da
raça sindi, Dr. Manelito como é conhecido entre os amigos cria-dores, procura
valorizar nessa raça rústica não só sua vocação leiteira milenar, como também a
pos-sibilidade de investimentos na boa aptidão para corte. Para manter o lema
de balde sempre cheio, as fazendas Carnaúba e Pau Leite, ambas localizadas no
estado da Paraíba, contam com boas matrizes e reprodutores, entre os quais se
destacam as vacas Mabiroba-D e Parafina-D e os touros Iaque-D e Danúbio-FC,
este último, recordista nacional na avaliação genética da Embrapa Gado de
Leite. Salientando a vocação nordestina, o criador investe também na criação de
guzerá e ainda em ovinos e caprinos.
Nesta entrevista ele fala sobre a crença
no gado vermelho, o trabalho diário como criador e a abertura de mercado para a
raça – em 2005, o sindi contou com a realização da sua primeira feira única no
Brasil, a ExpoSindi realizada em outubro, além do primeiro leilão composto
apenas de exemplares sindi, com cerca de 60 bovinos registrados colocados à venda
e faturamento total de R$259.840,00.
E é com a habilidade de quem se dedica há
mais de três décadas ao gado vermelho, mais exatamente na região do Cariri
Velho, no município de Taperoá, que seu Manelito concedeu esta entrevista à
revista ABCZ.
Revista ABCZ: O senhor é
engenheiro por formação. Porque decidiu se dedicar à pecuária?
Manelito Vilar: Sou engenheiro
civil por formação acadêmica. Por natureza e sentimento, sempre fui criador. A
dedicação exclusiva à pecuária ocorreu por sucessão súbita de meu pai, há 36
anos. Foi um encargo, mas, também, um reencontro com minhas raízes e minha
vocação essencial.
Revista ABCZ: E porque a opção
pelo zebu, especificamente pelo Sindi e o Guzerá?
Manelito Vilar: Minha escolha
pelo sindi decorre da minha ligação com as terras secas do Nordeste e da crença
radical de que é preciso respeitar a harmonia entre os animais e as latitudes.
Meu pai, desde 1934, já criava e ordenhava guzerás de Cantagalo (RJ) e eu me
limitei a seguir sua lucidez e sua experiência de vida no Cariri das secas. Com
a morte de seu Joãozinho Abreu nos anos 70, simultaneamente à segurança que
adquiri no uso dos capins perenes que consegui importar da Austrália, fui
buscar outro zebu leiteiro dos pré-desertos da Ásia, temendo que não desse para
ficar tudo no Guzerá JA, puro e bom de leite. Se não tiver leite, não é guzerá
e nem é sindi. O sindi, de rebanho complementar, já é hoje metade do gado total
que eu crio. Há uma dívida nacional de gratidão com José Cezário Castilho, que
o preservou no sudoeste de São Paulo e com Felisberto Camargo que foi buscá-lo
para produzir na Amazônia, também de clima rigoroso, em 1952.
ABCZ: Como é a forma de criação
do sindi em sua propriedade?
Manelito Vilar: No pasto nativo
da rica caatinga nordestina em consórcio com área de capim Buffel e Urocloa, na
época das chuvas. No segundo semestre seco, as vacas em produção comem feno
desses capins, palma forrageira, uréia e discreto suplemento de concentrados
nas cocheiras. A ordenha é sistemática para sindis e guzerás, com controle
leiteiro e avaliação genética oficiais. Nas secas extremadas, o volumoso
utilizado é o bagaço de cana das usinas do litoral, hidrolisado com cal.
ABCZ: O senhor seleciona seus
animais para obter dupla função. O sindi tem conquistado bons resultados tanto
na produção de leite, quanto de carne?
Manelito Vilar: A conversão
alimentar do sindi nos períodos secos, os ossos firmes e finos de sua carcaça,
sua vocação leiteira e milenar e a qualidade do seu leite, fazem um conjunto de
bons resultados aqui ou no resto do mundo tropical onde se queira definir uma
raça apropriada de bovinos, mesmo havendo resistência cultural a modismos ou a
promiscuidades genéticas. Quando a produtividade for avaliada não pela produção
individual de cada vaca ou peso absoluto de cada boi e sim pela produção no
tempo, de cada hectare de terra ocupado com a criação, sob a ótica racional da
dupla função – o caminho do Brasil molhado ou seco – a eclética raça sindi será
estrelada na constelação pecuária de nosso País. O Brasil é pioneiro mundial na
seleção funcional de zebuínos, e se tornou por causa deles, um dos poucos do
mundo que criam um bovino por habitante e pode, como ninguém, oferecer a seu
povo, proteínas nobres a baixo custo.
ABCZ: O senhor acredita que
apostar no sindi é a melhor maneira de viabilizar a pecuária na região
semi-árida, uma região pouca valorizada pelo governo e instituições públicas do
Brasil?
Manelito Vilar: A pecuária do
mundo é majoritariamente praticada nas zonas secas. No semi-árido do Brasil a
melhor maneira de viabilizar a vida em padrões decentes, é através da pecuária,
à base de elementos biológicos (plantas e animais) compatíveis com seu clima
caprichoso e saudável. Já era assim desde antes de Cristo, no sertão de Nazaré,
na Galiléia. As nossas instituições públicas, desde as de ensino e pesquisa até
as de fomento e crédito rural, nunca assumiram as potencialidades da floresta
seca do Nordeste. Escapamos até agora e havemos de continuar vivendo, pela
conterraneidade com o filho de Deus e graças à persistência dos sertanejos e
suas cabras e ovelhas nativas, suas ervas e leguminosas, suas guzerás e suas
sindis.
ABCZ: O pequeno porte do sindi
fez com que muitos criadores desacreditassem no potencial da raça. Apesar
disso, os criadores da raça exaltam o pequeno porte como uma característica que
é diferencial e garante preferência no exterior. Como o senhor avalia essa
contradição?
Manelito Vilar: Costumo dizer
que se confunde muito o conceito de “volume aparente” com o de “peso
específico” ou rendimento. O menor porte do sindi é uma virtude para efeito de
precocidade, prolificidade e velocidade de ganho em peso. A longevidade do
guzerá é maior. O conjunto das duas raças, rústicas, leiteiras, fisiologicamente
perfeitas para a fotossíntese do mundo tropical é fantástico. Sem, contudo,
misturar raças, indo contra conceitos básicos da zootecnia. O menor porte do
sindi, talvez, esteja relacionado com sua fantástica precocidade e seu rúmen,
forjado nos pré-desertos da Ásia, convertendo melhor o material fibroso do
mundo tropical cheio de sol, em leite rico e carcaça de ossos finos bem coberta
por carne enxuta.
ABCZ: Recentemente, foi
realizado o primeiro leilão nacional da raça. Como está a comercialização de
sindi no Nordeste? Qual a avaliação do senhor diante os resultados da primeira
exposição de gado sindi?
Manelito Vilar: A primeira
exposição e os leilões da raça sindi foram episódios marcantes na evolução da
verdadeira pecuária do Nordeste. A procura por fêmeas sindi é sufocante. E
machos sindis estão cada vez mais sendo usados para absorver lastros mestiços
de gado europeu e mesmo de outros zebuínos, cuja fisiologia não se harmoniza
tão bem com a nossa natureza. A realidade vai se impondo por si e esses eventos
aceleram o processo de sua apreensão. A integração entre o sindi e a ABCZ é
valiosa.
ABCZ: A introdução do sindi no
Brasil contou com a participação de homens que visionaram na raça uma opção
para a seca. Fale um pouco sobre isso.
Manelito Vilar: A introdução do
sindi no Nordeste foi devida ao entusiasmo ideológico de Virgolino de Farias
Leite (técnico da ABCZ) e a consciência profissional de seu primo, o
zootecnista Paulo Roberto de Miranda Leite. Foi algo muito pouco institucional.
Houve muito espírito público das pessoas, inclusive algumas da Universidade
Federal da Paraíba e, sobretudo, de criadores mais esclarecidos.
ABCZ: A partir deste ano todos
os registros genealógicos (RGD e RGN) de animais da raça sindi terão desconto
de 50% até o final de julho de 2006. O senhor acredita que essa medida irá
ajudar a fortalecer a raça ainda mais no País?
Manelito Vilar: Acredito
firmemente. Esse estímulo deveria ser estendido também para os custos das
provas zootécnicas do sindi, por um prazo racional.
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