Rio de Janeiro, 18 de agosto de 2011.
A CARTA DO SOL assenta-se no seguinte contexto.
A disseminação em grande escala do uso da energia solar fotovoltaica no Brasil pode fornecer uma série de benefícios para a promoção de um desenvolvimento mais sustentável do país, destacando-se, dentre outros:
a) A energia solar fotovoltaica tem experimentado um forte crescimento no mundo, o que tem possibilitado significativa redução nos seus custos. O Brasil pode se beneficiar dessa situação internacional, pois apresenta condições favoráveis ao aproveitamento de tal fonte, não somente devido às condições climáticas, extensão territorial e alto preço da energia elétrica em determinadas regiões, em comparação com outros países, mas também pelas características do seu sistema elétrico e pela grande disponibilidade de recursos naturais, como o silício, matéria-prima de grande parte das placas fotovoltaicas;
b) A introdução da geração elétrica fotovoltaica evitaria custos de transmissão e de distribuição, pelo fato dessa tecnologia permitir a instalação dos equipamentos na proximidade do ou diretamente no local de consumo final, podendo proporcionar uma redução na tarifa de energia elétrica e aumentar a confiabilidade do suprimento de eletricidade ao consumidor final. Adicionalmente, o advento das redes, medição e edifícios inteligentes (smart grids, smart metering, smart buildings), proporciona uma convergência tecnológica que certamente favorecerá o desenvolvimento da geração elétrica distribuída de pequeno porte;
c) Além de contribuir para diversificar o suprimento da demanda de energia elétrica, a expansão dos sistemas fotovoltaicos abre novas oportunidades tecnológicas para o país, que é rico no insumo básico para fabricação das células e filmes, e dispõe de um parque industrial de componentes extenso e diversificado, favorecendo a instalação de toda a cadeia produtiva industrial e de serviços, e gerando dessa maneira emprego e renda, vetores fundamentais para o desenvolvimento econômico nacional e regional;
d) A consolidação de uma indústria fotovoltaica competitiva no país permitiria atender plenamente as necessidades energéticas da população rural dispersa e de toda a Amazônia, assim como o mercado de usos específicos (sinalização, telecomunicações, instalações ambientais e militares, etc.); nesses casos, a alternativa fotovoltaica muitas vezes já é a mais barata e mais adequada;
e) Sem desconsiderar os desafios existentes quanto à eficiência, à tecnologia e ao preço da energia fornecida, a fonte solar fotovoltaica será mais uma contribuição para a preservação do caráter limpo de nossa matriz energética de geração de eletricidade; com efeito, a energia solar.
1. fotovoltaica pode contribuir para manter elevada, a médio e longo prazo, a participação de energia renovável na matriz elétrica, de acordo com um dos objetivos específicos do Plano Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC.
No entanto, algumas barreiras ainda precisam ser superadas para que a energia solar fotovoltaica alcance posição de destaque no mercado brasileiro. Não se pode deixar de reconhecer que:
I. Apesar de o custo de geração de energia elétrica a partir da tecnologia fotovoltaica ter apresentado significativa redução nos últimos anos, ainda é preciso incrementar essa diminuição para aproximá-lo dos valores praticados por outras fontes de geração de energia elétrica, visando manter a tarifa para o consumidor final em patamares aceitáveis;
II. Os mercados onde a tecnologia fotovoltaica é mais econômica que as demais – Amazônia, rural disperso, áreas de preservação ambiental ou de fronteira etc. – são hoje dependentes de equipamentos importados, frequentemente inadequados, caros e de difícil reposição; no entanto, a pequena dimensão e a grande dispersão dessas aplicações tornam esses mercados insuficientes para dar escala e atratividade ao estabelecimento da cadeia produtiva industrial no país;
III. O mercado fotovoltaico no Brasil ainda é incipiente e a fabricação de sistemas fotovoltaicos precisa ganhar escala de produção para reduzir seu custo; no entanto, a incerteza quanto à dimensão do mercado inibe investimentos na ampliação da capacidade de produção, gerando um círculo vicioso que precisa ser rompido;
IV. A sistemática atual de contratação de energia por meio de leilões precisa ser adequada ao estágio de desenvolvimento e às características próprias dessa fonte, que ainda necessita de incentivos, à imagem dos que o PROINFA proporcionou com tanto sucesso à fonte eólica, para ampliar sua participação no mercado, além de um maior aprendizado sobre seu desempenho tecnológico e sua conexão e operação;
V. As regras e critérios técnicos para conexão à rede e comercialização de energia elétrica, específicos para a baixa tensão, precisam ser definidos o quanto antes, a exemplo do que foi feito em alguns países europeus, onde a energia solar fotovoltaica já começa a ter participação significativa na matriz de geração elétrica; inclusive no Brasil, com frágil regulamentação para geração distribuída, algumas distribuidoras têm se antecipado na fixação de normas técnicas de conexão para a baixa tensão;
VI. O conhecimento sobre o interesse desse segmento para o país ainda é restrito a alguns especialistas e partes diretamente interessadas, necessitando a adoção de ações de disseminação da informação e sensibilização dos setores acadêmico, produtivo e governamental, e de toda a sociedade, assim como a formação e capacitação de pessoal especializado.
CARTA DO SOL – DIRETRIZES
Em face dos benefícios e das barreiras, e tendo em vista nortear a condução dos debates para incentivar a energia solar fotovoltaica no Brasil, os signatários da Carta do Sol propõem às diferentes instâncias do Governo Federal e de Governos Estaduais e Municipais as seguintes diretrizes:
1. Promover a articulação institucional para a criação de uma esratégia de incentivos apropriados à geração de energia solar fotovoltaica no ambiente do setor elétrico brasileiro, que garanta o crescimento dessa fonte no mercado no médio/longo prazo;
2. Integrar as diferentes instâncias do Governo Federal e de Governos Estaduais e Municipais para a criação de sinergias na formatação de planos, projetos e programas para a promoção da energia solar fotovoltaica;
3. Estabelecer marco regulatório específico para a geração de energia solar fotovoltaica, além do disposto no § 8, Art. 23 da Lei 10.438 de 2002, que já prevê a adoção de um programa específico de estímulo à energia solar fotovoltaica, desde a criação do PROINFA que contemplou apenas pequenas centrais hidroelétricas, energia eólica e de biomassa;
4. Adotar incentivos financeiros, fiscais e tributários adequados ao desenvolvimento da cadeia produtiva da energia solar fotovoltaica, desde a transformação da matéria prima, fabricação e instalação dos componentes e sistemas, até a venda da energia elétrica;
5. Estabelecer metodologias padronizadas para a identificação do potencial solar, tais como um período de tempo padrão para medição de irradiação solar, nas regiões favoráveis a projetos de usinas fotovoltaicas que possam vir a buscar habilitação em potenciais leilões de energia, como já se dá no caso da medição de vento para habilitação de projetos eólicos;
6. Definir diretrizes para aperfeiçoar o processo de licenciamento ambiental de projetos de geração de energia solar fotovoltaica;
7. Apoiar e articular uma política industrial para fomentar a cadeia produtiva fotovoltaica no Brasil, desenvolvendo o mercado de equipamentos e serviços, incluindo a atração de investidores internacionais e o favorecimento da transferência de tecnologia;
8. Implantar, gradualmente, políticas de incentivo à nacionalização dos equipamentos e serviços contratados pelos empreendimentos, para que o parque já existente de fornecedores nacionais venha a crescer no Brasil;
9. Incrementar programas de P&D que assegurem o domínio da tecnologia de energia solar fotovoltaica e coloquem o país em posição de destaque no cenário mundial;
10. Fomentar programas de capacitação e formação de recursos humanos para atuar em todas as etapas da cadeia produtiva da energia solar fotovoltaica.
CARTA DO SOL – PROPOSTAS DE MEDIDAS
Para implantar as diretrizes mencionadas acima, os signatários da Carta do Sol se propõem a discutir com as respectivas instâncias públicas envolvidas (incluindo as instituições abaixo citadas e outras que se mostrarem necessárias) a viabilidade das seguintes medidas, a serem ampliadas e aprimoradas no decorrer do debate:
A. Criar condições para o desenvolvimento de um mercado para energia elétrica solar fotovoltaica no país, inclusive por meio da promoção de projetos de demonstração, de pelo menos 50 MW anuais a partir de 2012, contemplando os diversos segmentos de mercado, em particular usinas (UFVs) no sistema interligado e em mini-redes isoladas, estádios, aeroportos, portos, estacionamentos, centros comerciais, prédios públicos, universidades e escolas, condomínios, bairros, eletrificação rural no âmbito do Programa Luz para Todos, dentre outros; [CNPE, MME, EPE, ANEEL, CCEE, BNDES]
B. Cumprir o quanto antes o disposto no § 8, Art. 23 da Lei 10.438 de 2002, que ao excluir a energia solar do PROINFA previu a criação do dispositivo especial para seu apoio, ainda não estabelecido: “instituir programa de fomento específico para utilização de equipamentos destinados à transformação de energia solar em energia elétrica empregando recursos da Reserva Global de Reversão - RGR e contratados diretamente com as concessionárias e permissionárias de serviço público de energia elétrica, através da Eletrobrás”; [CNPE, MME, Eletrobrás, ANEEL, CCEE]
C. Definir com celeridade os aspectos técnicos de conexão, definição de condições, normas e padrões para projetos de energia solar fotovoltaica conectada à rede (geração distribuída), por níveis de tensão e potência, e das formas de viabilização da introdução gradativa de sistemas de net metering a médio/longo prazo, em conjunto com as distribuidoras, permitindo viabilizar a compra e venda de energia solar fotovoltaica interligada à rede elétrica por produtores independentes, autoprodutores, comercializadores, distribuidores e consumidores; [MME, ANEEL, CCEE] 5
D. Isentar de 100% da TUSD/TUST, para compra e venda da energia, os projetos de energia solar fotovoltaica, até um determinado nível de potência; [MME, ANEEL]
E. Definir realisticamente uma quantidade anual de energia solar fotovoltaica a ser contemplada nos Planos Decenais de Expansão – PDEs e no Plano de Expansão de Longo Prazo - PNE, e indicação de mecanismos de incentivo para sua inserção na matriz elétrica nacional sem prejuízo da modicidade tarifária; [CNPE, MME, EPE, ANEEL]
F. Definir alternativas atrativas para o estabelecimento de leilões específicos para a energia solar fotovoltaica, no âmbito de uma estratégia de curto/médio/longo prazo, contemplando a geração por usinas fotovoltaicas distribuídas, próximas aos centros de carga e/ou em extremidades de redes, onde essas UFVs forem particularmente atrativas para o sistema elétrico, proporcionando redução de perdas, melhora da qualidade da energia e evitando ou postergando investimentos elevados de reforço da rede, entre outros benefícios; [CNPE, MME, EPE, ANEEL, CCEE, BNDES]
G. Estudar a viabilidade e as modalidades mais adequadas do estabelecimento, no médio prazo, de um mercado de certificados negociáveis de aquisição e/ou geração de energia solar fotovoltaica a serem exigidos das empresas de distribuição de energia elétrica, em quantidade a ser definida em percentual de sua energia contratada, de acordo com as metas a serem estabelecidas para a energia solar fotovoltaica nos PDEs e no PNE [CNPE, MME, EPE, ANEEL, CCEE, BNDES]
H. Avaliar o uso dos recursos da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE e do Fundo Nacional de Mudanças Climáticas - FNMC (para subsídio ao investimento ou pagamento de tarifas premium), para viabilizar a implantação da estratégia de promoção da energia solar fotovoltaica na matriz elétrica brasileira sem prejuízo da modicidade tarifária, inclusive para apoio aos projetos de demonstração; [CNPE, MME, MMA, BNDES]
I. Estabelecer que os financiamentos do BNDES às empresas distribuidoras de energia elétrica para a contratação de projetos de energia solar fotovoltaica, incluídos em seus planos plurianuais de investimentos, possam ser separados em subcréditos específicos, em condições financeiras privilegiadas como as oferecidas para um produtor independente de energia renovável; [BNDES]
J. Utilizar o instrumento de licenciamento ambiental para a promoção da energia solar fotovoltaica, simplificando a emissão de licenças para projetos de energia solar e inserindo instalações de geração solar fotovoltaica como parte das condicionantes ambientais de projetos, em articulação com os instrumentos de viabilização dos Planos Nacional, Estaduais e Municipais de Mitigação das Mudanças Climáticas; [órgãos ambientais nas esferas federal, estadual e municipal]
K. Criar mecanismos de compras governamentais que privilegiem a utilização de energia solar fotovoltaica em edificações e obras públicas, em consonância com a nova redação do Art. 2º do Decreto-Lei n º 8666, através de instrumentos como Guias de Compras e de Edificações Sustentáveis; [Governos federal, estaduais e municipais]
L. Criar programa de benefícios, incentivos e diferimentos fiscais (de IPI, IRPJ, ICMS, ISS, IPTU e outros impostos, taxas e tributos federais, estaduais e municipais), por tempo determinado, assim como linhas específicas de financiamento para incentivar a instalação de toda a cadeia produtiva solar fotovoltaica no país; [Ministério da Fazenda, Confaz, Sefaz estaduais e municipais, instituições financeiras]
M. Facilitar o acesso das empresas da cadeia produtiva fotovoltaica à subvenção econômica e demais instrumentos de políticas públicas voltadas para o incentivo à inovação tecnológica industrial, tais como: Lei do Bem, Lei da Inovação, Lei de Informática, Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Indústria de Semicondutores (Padis), Fundo Tecnológico (Funtec) do BNDES, entre outros [MDIC, MCT, BNDES, FINEP]
N. Reforçar o dispositivo nacional de ensino, pesquisa, desenvolvimento e inovação, fomentando a área solar fotovoltaica junto às universidades, laboratórios, instituições de ciência e tecnologia – ICTs, parques tecnológicos, incubadoras e empresas de base tecnológica etc. [MCT, MEC, CAPES, CNPq, FINEP, FAPs, BNDES].
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CARLOS MINC
Secretário de Estado do Ambiente
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JULIO BUENO
Secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços 7
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SUZANA KAHN
Subsecretária de Economia Verde da Secretaria de Estado do Ambiente
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RENATA CAVALCANTI
Subsecretária de Energia, Logística e Desenvolvimento Industrial da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços
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EMILIO LEBRE LA ROVERE
Professor da Coppe/UFRJ
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