por João Suassuna — Última modificação 12/07/2010 09:34
Com um olho no futuro e o outro no desenvolvimento sustentável, pesquisadores do Rio de Janeiro criaram uma mistura de asfalto que substitui a fibra de celulose pelo bagaço da cana-de-açúcar. O método, além de mais barato e mais simples, reutiliza as sobras do processo de fabricação do açúcar e do álcool.
O estudo, realizado por cientistas do Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia Fluminense (IFF), é parte da tese de doutorado do engenheiro civil Claudio Leal. Ele comprovou a eficácia do bagaço como aditivo estabilizador para o asfalto, evitando que o cimento escorra durante as etapas de mistura ou aplicação do pavimento. “As características do bagaço da cana e da fibra de celulose são praticamente as mesmas. O bagaço apresentou até mais reentrâncias que acomodam e seguram os agregados (brita) do asfalto”, observa Leal.
A aplicação desse aditivo é especialmente eficiente no asfalto de matriz pétrea (SMA, sigla em inglês), muito utilizado em rodovias com tráfego intenso, aeroportos, estacionamentos, áreas de carga e descarga e paradas de ônibus, entre outros pavimentos que requerem maior resistência. “O uso do bagaço de cana na mistura evita que toneladas desse resíduo sejam descartadas sem aproveitamento”, acrescenta o pesquisador.
Porém, o engenheiro destaca que a principal vantagem do bagaço da cana em relação à fibra de celulose é a economia, já que a fibra é um produto feito na Alemanha e importado pelo Brasil. Além disso, o processo de obtenção do bagaço como aditivo da mistura asfáltica é extremamente simples (veja infografia). “O bagaço precisa apenas ser seco e peneirado, enquanto a produção da fibra de celulose envolve a polpação da madeira — de onde é retirada —, um processo químico complexo e que gera alguns efluentes (produtos líquidos e gasosos produzidos pelas indústrias)”, compara o coordenador da pesquisa.
Benefício ambiental
Atualmente, são produzidas no Brasil cerca de 132 milhões de toneladas de bagaço de cana. Cada tonelada de cana moída gera cerca de 270kg do bagaço. Embora a maior parte seja queimada nas caldeiras das próprias usinas, para gerar energia térmica ou elétrica, cerca de 20% do resíduo não é aproveitado, sendo lançado no meio ambiente. “Considerando-se que a produção de uma tonelada de SMA absorve cerca de 3kg de aditivo, o gasto com a fibra de celulose é entre R$ 10 e R$12 por tonelada de asfalto. Sua substitutição, portanto, representaria uma redução de custo a quase zero”, demonstra Regina Aquino, professora do IFF e orientadora de Leal no estudo.
Para João Paulo Souza Silva, engenheiro civil e coordenador do Laboratório de Engenharia Rodoviária da Universidade de Brasília (UnB), pesquisas como a do IFF dão alternativas de uso sustentável e responsável dos rejeitos da produção industrial. “A pesquisa sobre a utilização de resíduos é imprescindível, pois há uma escassez de material de boa qualidade para nossa engenharia.” Silva ressalta que as técnicas de reutilização desses rejeitos devem ser práticas, simples e ter viabilidade. “Não adianta ter o resíduo e dar a ele um tratamento caro até chegar ao resultado final. Os métodos devem ser simples e ter uma destinação viável e responsável, que, de preferência, não gere novos resíduos”, opina o engenheiro da UnB.
O próximo passo do estudo do IFF é a construção de um trecho experimental na BR-356, entre Campos dos Goytacazes e São João da Barra, no norte do estado do Rio de Janeiro, usando a nova fórmula do SMA.
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