sábado, 17 de julho de 2010

ICMS ECOLÓGICO

Ações de preservação nos municípios poderão ser compensadas mediante
repasse dos recursos arrecadados com o ICM (Foto: Patrícia Araújo)


Postamos, abaixo, importante artigo produzido pelo Dr. ELCIO ALVES BARROS, Engenheiro Agrônomo do Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA, e atual Coordenador do Comitê Estadual da Reserva do Baiosfera da Caatinga de Pernambuco - CERBCAA/PE, estudioso da matéria.

"O ICMS Ecológico de Pernambuco e unidades de conservação".

A Constituição Federal de 1988 permitiu aos Estados através de seu artigo 158, definir em legislação específica, parte dos critérios para o repasse de recursos do ICMS a que os municípios têm direito, 25% do total arrecadado. A partir deste dispositivo legal surgiu a denominação ICMS Ecológico que destina parte dos recursos do ICMS para municípios que se habilitam a estes recursos por critérios relacionados a temas ambientais. Não se trata de uma nova modalidade de tributo ou uma espécie de ICMS, não há qualquer vinculação do fato gerador do ICMS a atividades de cunho ambiental. Da mesma forma, obedecendo a Constituição Federal, não há vinculação específica da receita do tributo para financiar atividades ambientais.
O tratamento de resíduos sólidos urbanos e a existência de unidades de conservação nos territórios municipais são critérios utilizados por todos estados da federação que aderiram ao preceito constitucional. O ICMS Ecológico é assim um forte e moderno instrumento de gestão ambiental para implantação de políticas ambientais através da descentralização de ações públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável. Podemos dizer que é uma compensação financeira por restrição a atividades econômicas tradicionais, isto é, o município recebe um acréscimo em sua receita do ICMS porque parte de seu território não está sendo utilizada, por exemplo, para plantios ou criações que gerariam receita tributária em favor do município. E, principalmente, porque o município está sendo ressarcido por serviços ambientais reconhecidos pelo estado e pela sociedade.
Criado pioneiramente no Paraná, em 1991, o ICMS Ecológico foi adotado também em mais de dez outros Estados brasileiros e está em debate ou com anteprojetos de Lei em tramitação nas respectivas casas legislativas de outros estados. Segundo Wilson Loureiro, no Estado do Paraná a Lei do ICMS Ecológico, em relação à conservação da biodiversidade tem por objetivos:


(a) aumento do número e da superfície de unidades de conservação e outras áreas especialmente protegidas (dimensão quantitativa);


(b) regularização, planejamento, implementação e busca da sustentabilidade das unidades de conservação (dimensão qualitativa);


(c) incentivo à construção dos corredores ecológicos, através da busca da conexão de fragmentos vegetais;


(d) adoção, desenvolvimento e consolidação institucional, tanto em nível estadual, quanto municipal, com vistas à conservação da biodiversidade e,


(e) busca da justiça fiscal pela conservação ambiental.


No caso paranaense, é importante destacar que entre 1992 e 2000 houve um incremento de 1.894,94 por cento em superfície das unidades de conservação municipais, de 681,03 por cento nas unidades de conservação estaduais, 30,50 por cento nas unidades de conservação federais e terras indígenas e de 100 por cento em relação as RPPN estaduais. Houve ainda melhoria na qualidade da conservação dos parques municipais, estaduais e das RPPN.


No final de dezembro de 2000, foi criado o ICMS Socioambiental do Estado de Pernambuco através da Lei n.º 11.899 de 21 de dezembro. Em Pernambuco os critérios ambientais estavam representados nesta nova lei pela implantação de sistemas de tratamento de resíduos urbanos e unidades de conservação. Outros critérios foram incluídos na lei associando o desempenho das gestões municipais relativos aos setores de educação e saúde e, também, incluiu o aumento da receita própria dos tributos municipais.


A implantação desta lei causou forte reação da maioria dos prefeitos de Pernambuco que pressionaram o executivo e o poder legislativo contra a mesma. Por conta desta pressão o governo estadual encaminhou nova lei à Assembléia Legislativa que aprovou em 29 de setembro de 2003 a Lei n.º 12.432, reduzindo os valores percentuais de cada critério de distribuição de ICMS, conforme quadro apresentado a seguir:

CRITÉRIO LEI 11.899 LEI 12.432
Resíduos Sólidos 5% 2%
Saúde 3% 2%
Educação 3% 2%
Unidades de Conservação 1% 1%
Receita Tributaria Própria 3% 1%
Total 15% 8%


Constata-se uma redução de quase 50% nos valores a serem transferidos aos municípios pelos critérios socioambientais da lei atualmente em vigor. Isso significa um retrocesso em termos de política ambiental, representado pela redução do percentual do critério tratamento de resíduos urbanos e manutenção do percentual de apenas 1% para unidades de conservação.


Na regulamentação da lei 12.432, através dos decretos 23.473 e 25.574 definiram-se os critérios de distribuição da parcela dos recursos do ICMS que cabe aos municípios a partir de informações prestadas pela CPRH (Agência de Meio Ambiente de Pernambuco) a SEFAZ (Secretaria Estadual da Fazenda), calculadas nos termos do Índice de Conservação da Biodiversidade do Município – ICBM, conforme especificado neste Decreto.


O Art. 3º do Decreto 25.574 diz que para cálculo do ICMS Socioambiental, referente a UCs, serão consideradas variáveis de caráter Quantitativo e Qualitativo. As variáveis de caráter quantitativo são: Área da UC Área do município de localização da UC Fator de Conservação

As variáveis de caráter qualitativo são: O coeficiente de conservação da UC, e desempenho das ações que visam garantir e melhorar a conservação da UC, a partir das respectivas Tábuas de Avaliação, que considera: A regularização fundiária A qualidade física da área A fiscalização da área


O plano de manejo A estrutura administrativa, entre outros, não especificados na lei e no decreto que a regulamenta.Desde a sua regulamentação até hoje a CPRH não utiliza os critérios qualitativos devido a dificuldades operacionais internas. Isto tem causado situações de flagrante injustiça na distribuição dos recursos. Um exemplo claro para nós é quando comparamos dois municípios da região agreste do nosso Estado. Um, que denominamos de A, tem parte de seu território ocupado por uma unidade de conservação criada pelo governo federal, onde não houve e na há nenhuma participação do governo municipal, pelo contrário a municipalidade faz vistas grossas às ações de degradação provocada por caçadores, posseiros, falta de apoio administrativo, etc.


Outro município, que denominamos de B, situado na mesma região tem uma pequena RPPN em seu território, que recebe apoio da prefeitura local para realização dos diversos eventos de educação ambiental que a RPPN promove, eventos que contam com a participação de professores e alunos da rede pública municipal. A prefeitura local também apóia a RPN conservando as estradas de acesso a área. Pois bem, o primeiro município recebeu em 2009 só pelo critério Unidade de Conservação, quase um milhão de reais, o segundo quatro mil reais. O quadro abaixo mostra um comparativo entre os dois municípios.

MUNICÍPIOS DIFERENÇA
POSITIVA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO OUTROS CRITÉRIOS TOTAL % UC/TOTAL
MUNICÍPIO A 126.117,92 996.746,58 181.931,92 1.304.796,42 76,4
MUNICÍPIO B 397.660,09 4.174,13 270.501,51 672. 335,73 0,62


Fica evidente que ao considerar apenas o critério quantitativo (no caso área da Unidade de Conservação) o ICMS Socioambiental de Pernambuco provoca um desequilíbrio grande entre as receitas dos municípios e não privilegia os aspectos ambientais e sociais que o legislador criou ao aprovar esta lei.


O CERBCAA/PE – Comitê Estadual da Reserva da Biosfera da Caatinga do Estado de Pernambuco reconhece o ICMS como um instrumento importantíssimo para a criação de novas unidades de conservação no Bioma Caatinga que tem menos de 4% de sua área protegida, sendo que menos de 1% sob a forma de unidades de proteção integral. Reconhecemos, também, que os recursos do ICMS Socioambiental são significativos ante os recursos disponibilizados pelo Estado de Pernambuco para o setor ambiental. No entanto, é preciso e urgente implantar todos os mecanismos de avaliação das UCs.


O CERBCAA/PE vem discutindo o aperfeiçoamento desta legislação através da participação em fóruns adequados como o CONSEMA – Conselho Estadual de Meio Ambiente, e a Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa de Pernambuco. Da forma como vem sendo executado em nosso Estado, desde seu inicio, o ICMS Ecológico não é um instrumento de incentivo à conservação ambiental. É apenas um instrumento de distribuição injusta dos recursos arrecadados de nós contribuintes.


O CERBCAA/PE tem propostas para discutir com os legisladores e governo estadual e dos municípios visando o aperfeiçoamento deste instrumento de política ambiental, que são:
Realizar a avaliação qualitativa das Unidades de Conservação anualmente
Aumentar o percentual destinado a Unidades de Conservação Acompanhamento pela sociedade organizada/entidades ambientalistas, do cálculo do ICBM anual Ampla divulgação dos resultados do ICBM anual.


Incluir na tábua de avaliação o critério órgão responsável pela criação da UC, atribuindo peso diferenciado a cada unidade, de acordo com o órgão responsável pela criação e manutenção da UC:

ÓRGÃO RESPONSÁVEL PELA UC PERCENTUAL
RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural 1,00
Muncipal 0,95
Estadual 0,90
Federal 0,50

Esta última sugestão fará com que os administradores municipais coloquem a questão ambiental em suas agendas administrativas, provocando assim uma área maior de território protegido em nosso estado a exemplo de outros estados. Acreditamos que com estas modificações conseguiremos aumentar a área protegida para conservação dos diversos biomas existentes em nosso estado, com a participação do poder público local assumindo responsabilidade pela conservação dos nossos recursos naturais, e tornando o ICMS Socioambiental do Estado de Pernambuco um instrumento efetivo e eficaz de política ambiental pública."

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