Rio Grande do Norte espera ações contra a seca
O Decreto de nº 22.637 do Governo
Estadual declara situação de emergência em 139 municípios, o que corresponde a
82 % dos 167 do Rio Grande do Norte, em virtude da chamada "seca
verde". O predomínio de poucas e irregulares chuvas em janeiro e
fevereiro, se prolongou em março e começo de abril, quando, segundo a
meteorologia, são os meses que apresentam maiores índices pluviométricos. Durante
o decreto, o Governo pretende realizar ações que vão desde investimentos em
infraestrutura, até descontos nas contas das pessoas que economizarem água
destinada à irrigação.
13/04/2012
A validade do decreto é de 90 dias, podendo ser
prorrogado por igual período. O documento prevê que os órgãos do Sistema
Nacional de Defesa Civil, sediados no Estado, ficam autorizados a prestar apoio
suplementar aos municípios afetados pelo desastre natural, mediante prévia
articulação com a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Codec).
Segundo o coordenador de Defesa Civil, coronel
Josenildo Acioli Bento, a legislação permite que o Estado se antecipe aos
municípios e decrete situação de emergência, em função das informações obtidas
através da Emparn, Secretaria Estadual da Agricultura (SAPP) e também da
Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos.
Apesar do Decreto, ainda não foi divulgado pelo
Governo um cronograma para as ações no interior do Estado. O objetivo do é
viabilizar a construção de barragens subterrâneas - obras que fazem parte do
programa "Segunda Água" -, o incremento da agricultura irrigada junto
aos pequenos produtores de forma racionalizada, facilitando, inclusive, o uso
da "Tarifa Verde", um desconto de até 73% na irrigação durante o
período noturno. Além disso, o Governo também vai buscar a liberação de emendas
parlamentares direcionadas ao setor rural, bem como o descontingenciamento de
verbas de programas do Governo Federal. As datas para as ações ainda não estão
definidas.
A execução de ações devem demorar mais um pouco
para os municípios afetados, devido à principal dificuldade, segundo o coronel
Josenildo Acioli Bento, de que apenas 37 municípios contam com apoio
institucional formalizado.
"O que a gente percebe é a falta de
interesse de ocupação preventiva dos gestores municipais", diz o coronel
Josenildo Acioli, para esclarecer que os municípios precisam se preparar para
uma série de exigências da Secretaria Nacional, por exemplo, relacionada à
aquisição do Cartão de Pagamento da Defesa Civil, com o qual se habilita a
receber recursos federais.
Acioli afirma que os municípios só terão acesso
aos recursos se estiverem de posse desse cartão, que pode ser solicitado na
agência regional do Banco do Brasil: "Se existir alguma exceção, essa
deverá vir de uma decisão do Governo Federal".
Segundo Acioli, a decretação da situação de
emergência também tem a finalidade de permitir, aos órgãos públicos, mais
agilidade nas ações de socorro à população afetada pela estiagem, pois de
acordo com o artigo 24 da Lei das Licitações (nº 8.666/90), pode haver a
contratação de serviços e obras com dispensa de concorrência pública.
A insuficiência das chuvas já afeta, reforça o
parecer técnico 002/2012 da Codec, a oferta de água para a produção agrícola e
pecuária, "bem como para o consumo humano e animal". Segundo ainda o
documento, pelo menos 500 habitantes estão na zona rural desses 139 municípios.
O monitoramento do inverno feito pelo Setor de
Meteorologia da Empresa de Pesquisa de Agropecuária do RN (Emparn) identifica
um acúmulo de chuvas no ano em 112 municípios. Segundo o parecer da Codec, o
desastre natural de estiagem que ocorre no Rio Grande do Norte "é
caracterizado como gradual, de evolução crônica e de nível III". Neste
caso, o fenômeno é tido como de grande porte e grande intensidade", onde
os danos causados são importantes e os prejuízos vultosos, contribuindo para
"intensificar a estagnação econômica e o nível de pobreza" na região semiárida
norte-riograndense e, consequentemente, os desequilíbrios nas regiões afetadas
pela escassez de chuvas.
População quer medidas urgentes para
abastecimento
O município de Luís Gomes, distante 452
quilômetros de Natal, é a localidade mais afetada com a falta de chuva no Rio
Grande do Norte. Além da água que não cai do céu há mais de dois meses, os
cerca de 10.500 habitantes sofrem com a falta de abastecimento da Companhia de
Águas e Esgotos do Estado (Caern) desde outubro passado devido à seca do açude
do local. Inconformados com a situação, parte da população resolveu protestar.
Na manhã de ontem, crianças, jovens e idosos interromperam o tráfego de
veículos na BR-405, que liga o RN a Paraíba.
Segurando faixas e cartazes, os moradores
gritavam palavras de ordem e exigiam alguma resposta por parte da Prefeitura ou
Governo do Estado. Eles querem que a obra de uma adutora seja retomada.
"Estamos cansados dessa situação humilhante. Não temos água para as
necessidades básicas. Alguma coisa precisa ser feita. Do jeito que está, alguém
vai acabar morrendo. É muito triste", desabafou a presidente da Associação
dos Produtores Rurais do Sítio Caixão, Maria Gerusa. "A agricultura eu nem
falo mais porque já perdemos tudo, queremos ao menos que o abastecimento seja
feito regularmente", completou.
O protesto teve início por volta das 7h e
interrompeu a viagem de muita gente. Irritados, motoristas desceram dos carros
e foram conversar com os organizadores da manifestação. "Eu não tenho nada
a ver com a falta d'água de ninguém. Preciso levar minha carga e já estou
atrasado. Acho isso um absurdo. O protesto deveria ser feito na Prefeitura, e
não aqui na estrada", disse o caminhoneiro Raimundo Nonato que
transportava sal de Mossoró para Uberlândia-MG.
Três viaturas da Polícia Militar do RN e uma da
Paraíba estiveram no local. Ambulâncias do Corpo de Bombeiros do município de
Pau dos Ferros ficaram presas no engarrafamento que se formou com o bloqueio na
via. De acordo com o pedreiro Wagner Almeida, um dos organizadores da
manifestação, essa não foi a primeira vez que a população de Luís Gomes sai às
ruas para protestar. "Já fizemos uma passeata e protesto na prefeitura,
mas não adiantou nada. Enquanto o problema não for resolvido, vamos continuar
fazendo manifestações. Aqui na BR ou no meio da cidade", informou.
Na manhã de ontem, a reportagem da TRIBUNA DO
NORTE tentou falar com o prefeito Francisco Tadeu Nunes. Na prefeitura,
funcionários informaram que ele estava participando de um encontro com a
governadora Rosalba Ciarlini na cidade de Caicó. "Ele foi justamente
tentar conversar com a governadora para encontrar uma solução para esse
problema", disse um funcionário.
De acordo com a assessoria de imprensa da Caern,
a falta de abastecimento da cidade foi ocasionada devido à seca do único açude que
servia de reservatório no município. "Como não tem mais água no
reservatório, suspendemos a cobrança da taxa de água bem como o
fornecimento", informou a assessoria. Como alternativa, a Caern,
juntamente com a Prefeitura, instalou 18 caixas d'água, cada um com capacidade
para 1.000 litros, em alguns pontos da cidade. Todos os dias, caminhões-pipa
abastecem essas caixas e a população retira a água para o consumo.
Ainda de acordo com a Caern, o problema só será
resolvido quando a adutora do Alto Oeste estiver construída. Segundo
informações de populares, as obras da adutora foram interrompidas há mais de
dois anos. "A Semarh está providenciando a perfuração de poços e o Governo
do Estado deve retomar a construção da adutora", informou a assessoria.
O protesto na BR-405 foi encerrado por volta das
9h. A Polícia Rodoviária Federal foi acionada, mas os populares desbloquearam a
via antes da chegada da PRF. "Mas se não for feito algo, a gente vai
voltar no início do mês para fechar a estrada de novo", disse um dos
protestantes.
Emparn chama atenção para complicações
A seca está afetando boa parte do Estado. Os
municípios localizados na região semiárida são os que mais necessitam de ajuda
para combater a falta de água. Na última semana, a Empresa de Pesquisa Agropecuária
do RN (Emparn) informou que o quadro atual pode trazer consequências perigosas
para o interior do RN caso se mantenha durante o mês de abril. Representantes
do municípios se reuniram e, juntamente com secretaria de Estado da
Agricultura, da Pecuária e da Pesca (Sape), elaboraram um documento em que
embasam o pedido para a decretação da situação de emergência.
De acordo com o documento, as chuvas ocorridas em
janeiro e fevereiro de 2012 foram consideradas de baixo volume. Em março, a
situação voltou a ocorrer. A ocorrência de chuvas foi considerada abaixo do
normal, configurando-se um quadro de "seca", "com sérias
consequências negativas para a atividade rural do Estado, que tem na
agricultura de sequeiro e na pecuária, as principais fontes de geração de renda
e de ocupação da mão de obra campesina".
Para as autoridades, "a situação vivencial
tende a se agravar à medida que se amplia a escassez hídrica no campo".
Conforme o documento entregue à governadora Rosalba Ciarlini, intitulado de
"Situação Agroclimática do Rio Grande do Norte", o impacto dessas
secas é complexo e diferenciado. Assim, há o prejuízo em "todos os elos
das cadeias produtivas".
O meteorologista da Emparn, Gilmar Bristot,
confirmou o registro de estiagem em parte do Estado. "A nossa preocupação
é que se confirme o quadro de estiagem, como já tivemos o mês de março, durante
o mês de abril", disse. Segundo ele, medidas precisam ser tomadas no
sentido de antecipar o cenário que pode se complicar.
Para tentar amenizar a situação, os prefeitos
contam hoje somente com a chamada "Operação Pipa", que é gerenciada
pelo Exército Brasileiro. Segundo alguns gestores, o programa é muito
burocrático e falho. "Pede-se muitos papéis para autorizar o
abastecimento. É difícil porque é muito irregular. Às vezes vem, às vezes
falta", disse Francisco Chagas, prefeito de Pilões, município localizado a
390 quilômetros de Natal. Ainda segundo o prefeito, o custo semanal com os
carros-pipa é de R$ 1.200,00. "Estamos nos desdobrando para poder pagar esse
valor, pois não temos condições". O único reservatório do município é um
açude que, segundo o gestor, está cheio com apenas 30% de sua capacidade.
Açudes têm capacidade comprometida
A Secretaria Estadual de Meio Ambiente e dos
Recursos Hídricos (Semarh) monitora a situação volumétrica de água de 44
reservatórios do Rio Grande do Norte e, de acordo com relatório encaminhado à
Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Codec), apenas a barragem Flechas, em
José da Penha, na região Oeste, tem volume suficiente para suportar a escassez
de chuvas até dezembro deste ano.
Com capacidade para armazenar 8,95 milhões de
metros cúbicos, atualmente a barragem Flechas tinha armazenado 3,8 milhões de
metros cúbicos (42,48%) até 29 de março, data da última medição.
O relatório da Semarh ainda mostra que 23 desses
reservatórios tem volume d'água para suportar o abastecimento de água humano e
animal, em sua maioria, até o ano de 2013.
Uma das situações mais críticas é do açude
Dourado, em Currais Novos, no Seridó, com volume atual de 5,73 milhões de
metros cúbicos ou 55,51% de sua capacidade, mas só tem suporte até fevereiro do
próximo ano.
Por intermédio de sua assessoria de imprensa, a
Semarh informou que nem sempre os reservatórios monitorados têm captação de
água pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern), pois em
algumas cidades do interior os açudes servem para abastecer as comunidades
rurais mais próximas da zona urbana, além de outras fontes, como os mananciais
subterrâneos de onde se retira água através de poços.
A Caern informa que apesar da estiagem, somente
três dos 152 sistemas de abastecimento de água de sua responsabilidade, todos
na região Oeste, estão em colapso, como em Antônio Martins, onde o açude Porcos
está seco desde julho de 2011.
Diariamente, três carros-pipa da Caern realizam
quatro viagens, totalizando 96 mil litros de água distribuídos por dia à
população da cidade.
Quanto a Luís Gomes, a Caern informa que tem
quatro carros-pipa levando 128 mil litros de água/dia para os habitantes da cidade,
onde estão instaladas 18 caixas de água com capacidade para armazenar 10 mil
litros, cada uma. Em Luís Gomes, o problema começou em novembro de 2011, quando
o açude Lulu Pinto secou.
Em Pilões, o açude homônimo está com 10,35% de
sua capacidade ou 610 mil dos 5,9 milhões de metros cúbicos que pode armazenar.
O nível melhorou um pouco com as chuvas de janeiro."
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