ÁREAS DE RISCO: A LEI nº 12.608 E OS LIMITES DOS ALERTAS PLUVIOMÉTRICOS, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos.
O meio técnico brasileiro, geólogos, engenheiros
geotécnicos, geógrafos, urbanistas, hidrólogos, profissionais de defesa civil,
etc., que lida diretamente com os problemas associados a áreas de risco,
enchentes e deslizamentos, saudou efusivamente a aprovação da Lei nº 12.608, de
10 de abril de 2012, recém assinada pela Presidência da República, que
instituiu a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC, o Sistema
Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC e o Conselho Nacional de Proteção
e Defesa Civil – CONPDEC. Essa moderna legislação é fruto direto das intensas
discussões promovidas pelas associações técnicas brasileiras em reação ao
recrudescimento das tragédias ocorridas em diversos estados brasileiros nos
últimos anos. Contou, felizmente, para sua elaboração e conclusão, com a
competência e a dedicação de profissionais pertencentes a vários órgãos do
governo federal. Um belo tento lavrado e que coloca o país em um patamar
internacional de qualidade no tratamento legal dessa terrível temática. Que
essa moderna legislação faça-se agora cumprir nas práticas governamentais em
seus vários níveis, federal, estadual e municipal.
A propósito, ressalte-se que essa ambicionada
legislação apóia-se conceitualmente e estrategicamente em uma abordagem de
cunho preventivo, onde se coloca como objetivo maior a eliminação radical das
áreas de risco.
Por sinal, a necessidade de se centrar o foco estratégico
de um programa de gestão de áreas de risco na abordagem preventiva ficou mais
uma vez evidente quando dos mais recentes acontecimentos de Teresópolis RJ,
ocasião em que, por decorrência de deslizamentos e enchentes causados por
chuvas intensas, mais 5 pessoas perderam a vida e mais de 1.000 moradores
ficaram desabrigados. Ao dedicar atenção prioritária e expectativa exagerada
nos sistemas de alertas pluviométricos a administração pública brasileira corre
o risco de cometer gravíssimo erro na definição de seus focos estratégicos para
a gestão dos trágicos problemas associados a deslizamentos e enchentes urbanas
no país. A insistência nesse erro resultará na continuidade da exposição de
milhares de brasileiros aos recorrentes e letais acidentes que a cada ano
registram-se em escala crescente em centenas de municípios do país.
Diferentemente dos terremotos, vulcanismos e
tufões, nossos desastres são todos associados a erros cometidos pelo próprio
homem na ocupação de áreas geologicamente inadequadas para tanto, ou áreas que,
por suas características, exigiriam no mínimo técnicas construtivas para elas
especificamente apropriadas. Ou seja, são desastres perfeitamente evitáveis,
caso assim decida e determine a administração pública.
Ou seja, para o caso brasileiro é fundamental ter
em conta que os sistemas de alerta pluviométrico para redução de riscos são
indispensáveis, mas fazem parte de uma lógica de Defesa Civil e só se prestam
em um quadro de ações emergenciais de curtíssimo prazo, a cobrir apenas o
espaço de tempo necessário à adoção de medidas corretivas e preventivas
definitivas. Porém, ao fazer desses sistemas seu foco privilegiado de ação e
busca de resultados e não investir esforço maior na abordagem corretiva e
preventiva, o governo estaria na prática adotando uma cruel estratégia de
convivência com o risco, de aceitação e administração do risco, uma temerária
acomodação frente ao que seria essencial e possível, qual seja a eliminação do
risco.
No âmbito desse correto entendimento, o foco corretivo
de curto prazo deverá estar na remoção e reassentamento dos moradores das áreas
de alto e muito alto risco geológico natural e na consolidação geotécnica das
áreas de baixo e médio risco natural, e o foco preventivo no oferecimento de
alternativas habitacionais à população de baixa renda e na rígida regulação
técnica das expansões urbanas para que radicalmente não sejam permitidas (e
muito menos incentivadas) novas ocupações de áreas geologicamente sensíveis e
para tanto impróprias.
Definitivamente há que se perceber que em nosso
país a questão áreas de risco está direta e prioritariamente vinculada às
políticas públicas de planejamento urbano e habitação popular, e somente sob
essa abordagem terá solução virtuosa e definitiva.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
· Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e
Ex-Diretor da Divisão de Geologia
· Autor dos livros “Geologia de Engenharia:
Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão”,
“Diálogos Geológicos” e “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”
· Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
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