Com seca, térmicas acionadas devem pesar na conta de luz
Usinas são alternativa recorrente para garantir o
abastecimento energético em um ano escasso de chuvas.
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1175762
Com a baixa incidência de chuvas em 2012, o
acionamento de usinas termelétricas tem sido mais importante para garantir o
suprimento das necessidades energéticas de todo o País. No Ceará, nos últimos
cinco meses, consecutivamente, foram registrados despachos fora da ordem de
mérito de custo, que são realizados de forma preventiva, a fim de evitar
futuros problemas de escassez. De acordo com o Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS), entre março e julho, mais de 59 mil megawatts/hora gerados a
partir da térmica Endesa Fortaleza foram utilizados, o que é suficiente para
abastecer uma cidade com quase 2 milhões de habitantes por aproximadamente um
mês.
Para se ter uma ideia, no ano passado - em que o nível de precipitações estava bem mais positivo -, não houve sequer um acionamento de térmicas cearenses fora de custo, conforme dados do ONS. Em 2010, que foi outro ano de seca, os despachos foram significativos: mais de 130 mil megawatts/hora.
Impacto na conta
Esta alternativa energética, logicamente, gera
custos, que acabam sendo inseridos na conta paga pelo consumidor no ano
seguinte. "Quando as termelétricas estão paradas, elas pagam apenas a
manutenção, mas quando são acionadas, há o consumo de combustível (gás ou
óleo), que vai ser pago pela tarifa", explica João Mamede Filho, professor
de Instalações Elétricas Industriais e Proteção de Sistemas Elétricos de
Potência da Unifor (Universidade de Fortaleza).
Todos pagam
Conforme elucida o especialista, o
"preço" é pago pelo consumidor geral. Por exemplo: se as térmicas do
Sudeste são as mais utilizadas, não é a população de lá que vai arcar sozinha
com os custos. Como aquela energia gerada entra no Sistema Interligado
Nacional, todos no País pagam. Esse impacto, segundo ele, depende do tempo que
as usinas ficarem ligadas.
Conforme José Caminha Araripe, gerente de
regulação e mercado da Coelce (Companhia Energética do Ceará), até o ano
passado, não havia influência na conta, mas, a partir das novas regras da
Aneel, criando as tarifas verde, amarela e vermelha, a tendência é de haver
encarecimento para o consumidor quando os reservatórios estiveram em condições
desfavoráveis e o governo optar pelas térmicas. Nestas situações, a Aneel
solicitará que a distribuidora de energia use a tarifa vermelha (mais cara). Já
em ocasiões de maior tranquilidade no sistema, a verde (mais barata) valerá.
De acordo com nota da Endesa, "a Central
Geradora Termelétrica de Fortaleza (CGTF) vem disponibilizando 100% de sua
capacidade para o ONS que, provavelmente, deverá incrementar o despacho global
de geração térmica nas próximas semanas". A empresa ressalta, ainda, que o
atendimento à demanda no sistema brasileiro é feito de forma integrada e
centralizada, cabendo ao ONS a responsabilidade de decidir pelos blocos de
energia a serem despachados. "A geração final de cada aproveitamento será
aquela que agregará a maior segurança para o Sistema Interligado", pontua.
Garantia
Conforme lembra João Mamede, "todo ano, o
ONS faz esse tipo de operação para economizar a água nos reservatórios. Quando
a temporada de chuvas começar a se consolidar, ele vai aliviando (os
acionamentos). É uma garantia para que o sistema não seja surpreendido".
Segundo dados do ONS, a capacidade total dos
reservatórios da região Nordeste encerrou julho com o menor nível desde 2003
para o mês: 60,4% de energia armazenada.
O patamar é bastante inferior ao registrado em
igual período do ano passado, quando se situava em 79,59%. No Sudeste e
Centro-Oeste, os reservatórios também encontram-se com níveis abaixo do usual
para esta época do ano.
Além do Ceará, outras matrizes termelétricas do
Nordeste têm sido usadas nos últimos meses. Em Pernambuco e no Rio Grande do
Norte, também houve recentes despachos fora da ordem de mérito de custo.
Reservatórios
60,4 por cento é o nível atual dos reservatórios
de água do Nordeste, de acordo com o ONS. No ano passado, patamar era de quase
80%
FIQUE
POR DENTRO
O porquê do despacho fora da ordem de mérito
O porquê do despacho fora da ordem de mérito
A dependência de usinas termelétricas para
assegurar o abastecimento nacional foi evidenciada em 2008, quando houve atraso
no início da estação chuvosa. Naquela ocasião, o Conselho Nacional de Política
Energética (CNPE) baixou uma resolução, autorizando o Operador Nacional do
Sistema Elétrico (ONS) a extraordinariamente, despachar recursos fora da ordem
do mérito econômico.
O ONS controla a oferta e a demanda no Sistema
Interligado Nacional, determinando quais usinas devem ser acionadas para gerar
a energia necessária à cobertura da demanda prevista, o que se conhece como
despacho. Isso é sempre feito por ordem de mérito econômico, isto é, as usinas
são despachadas pela ordem do seu custo de geração. As hidrelétricas são sempre
as de menor custo e, por isso, são chamadas a gerar antes das termelétricas.
Naquela ocasião, diante da possibilidade de
faltar água nos reservatórios das hidrelétricas, o CNPE decidiu dar permissão
para realizar o despacho fora da ordem de mérito, determinando, portanto, que
as usinas térmicas gerassem antes das hidrelétricas, de modo que estas pudessem
armazenar água nos reservatórios.
Consumo
de energia sobe mais na zona rural
A estiagem deste ano forçou a zona rural do
Estado a gastar mais com energia elétrica. O consumo cresceu 48,3% em julho
frente a similar mês de 2011. De acordo com o gerente de Regulação e Mercado da
Coelce, José Caminha Araripe, houve uma elevação muito superior a igual período
do ano passado, principalmente do uso de máquinas para bombear a água.
Segundo ele, porém, a participação desse segmento
é muito pequena no avanço total de 11,6% registrado no consumo no Ceará. Um
crescimento bem acima da média brasileira em igual período, que foi de 1,4%.
"Foram 7,9% de crescimento na área residencial e 7,2% na comercial. Esses
sim fizeram a diferença no desempenho geral de consumo", disse,
ressaltando que "Somente a parte residencial corresponde a três pontos
percentuais desses 11,6% de elevação", emendou.
O consumo industrial registrou expansão de apenas
0,7% no mês passado ante julho de 2011. Contudo, no acumulado do ano, a Coelce
constatou alta de 4,1% no consumo nessa área, 10,3% (residencial); 11%
(comercial) e de 45,1% (rural).
VICTOR XIMENES
REPÓRTER
REPÓRTER
COMENTÁRIOS
João Suassuna - josu@fundaj.gov.br
A questão da geração de energia elétrica no
Nordeste faz parte do nosso discurso contrário ao projeto da Transposição do
rio São Francisco. Lembramos, aos leitores, que desde o ano de 2005, a Chesf
não consegue gerar a energia necessária para o suprimento das demandas do nosso
desenvolvimento. Em 2010, por exemplo, as usinas da Companhia geraram 6.000 MW
médios, e o Nordeste necessitou de 8.000 Mw. 2.000 MW médios já tiveram que vir
de fora. Daqui até o início do próximo período chuvoso, mais termelétricas
deverão entrar em operação. E o custo disso? Ninguém se preocupa? Pois é nesse
cenário de escassez hídrica que as autoridades estão pretendendo retirar, do
Velho Chico, cerca de 127 m³/s para o atendimento da transposição. Velinhas e
caixas de fósforos espalhadas em locais estratégicos das residências será uma
boa alternativa para a convivência com esse tipo de situação.
João Suassuna é pesquisador titular da Fundação Joaquim Nabuco.
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