terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

No Ceará, agricultores criam um oásis produtivo em meio à seca.

Famílias encontram apoio para plantar e criar animais, vivendo tempo de fartura, apesar da estiagem.
31/05/2012

Potiretama. A vida não está fácil, e como não chove fica difícil ter comida para os bichos e na mesa de casa. A comunidade de Caatingueirinha, em Potiretama, enfrenta melhor o dilema da seca desde que intensificou a plantação de hortas, árvores frutíferas e a criação de galinhas no quintal de casa.

A iniciativa é própria. Até as sementes em estoque são do lugar. O que era alternativo virou principal e "quando deu fé", a renda é maior com o que produz no quintal do que a própria plantação de milho e feijão em regime sequeiro.



As atividades da comunidade, que foram incentivadas pela Cáritas Diocesana, tiveram início há cinco anos. Atualmente, possuem hortas, pomares e criação de animais que ajudam na subsistência das famílias FOTO: MELQUÍADES JÚNIOR

Antes mesmo que virasse uma política pública de Estado, os quintais produtivos da Caatingueirinha já contrastavam com grande parte do sertão ressequido, marcado pela fome e sede.

Apoio

Agora os projetos da comunidade já são apoiados pelos bancos e, assim, foi possível potencializar a ideia própria. O quintal de Antônia das Graças Moura Oliveira é talvez a parte mais importante da casa. Ali, ela com o marido e todos os filhos plantam, colhem e criam.

A geladeira está cheia de ovo caipira, a macaxeira acabou de sair do fogo, e mesmo quase não chovendo desde o Carnaval tem água para a horta suspensa de onde sai cheiro verde, coentro, pimentão e pimentinha. Logo mais à frente, árvores frutíferas garantem o suco do almoço.

A Caatingueirinha tem 59 famílias, e quem não vive no serviço público ou aposentadoria pode dizer que o "inverno tá ruim como um todo"´, mas "com certeza poderia estar pior", afirma Antônia das Graças, a "Gracinha". Ao todo 30 famílias da comunidade desenvolvem os seus quintais produtivos. A água para o regadio foi garantida pelas chuvas nos dias de carnaval: a cisterna calçadão (com um grande espelho de concreto, por onde escorre a água) ainda está com bom volume e ainda dá para mais meses.

Um viveiro de mudas garante plantas das mais diversas espécies. A que não for frutífera, dá para um bom chá ou tempero. As frutas são comercializadas na região. O que admirou até mesmo a Dona Gracinha, é que a produtividade no seu quintal está rendendo mais do que ela consegue normalmente na produção de milho e feijão em regime de sequeiro. "Aqui chegamos a tirar mais de R$ 5 mil reais por ano, só com essas plantas e a criaçãozinha aqui", define o seu quintal. Pode parecer pouco, mas ainda é mais do que a família tem conseguido anualmente na plantação de milho e feijão.

A Associação dos Trabalhadores de Caatingueirinha possui uma Casa de Semente com grãos produzidos ali mesmo, sem depender da remessa do Governo do Estado. O estabelecimento foi construído após uma gincana popular para arrecadação de fundos. O nome é bem sugestivo: Casa de Sementes Renascer do Sertão. Ali tem sementes de reserva que se continuar a "seca braba", eles tem estoque das mais variadas frutas e leguminosas para plantio nos quintais da comunidade.

As atividades da comunidade tiveram início cinco anos atrás, a partir do incentivo da Cáritas Diocesana de Limoeiro do Norte. Técnicos da instituição ensinavam como criar projetos de convivência com o semiárido. Hoje eles desenvolvem, além da casa de sementes, sistema agrossilvopastoril, farmácia viva, quintal produtivo e a criação de lideranças comunitárias. Também existiu apoio do P1+2 (Programa uma terra, duas águas), em parceria com a Articulação do Semiárido (ASA).

"Quando o governo começou a incentivar a agricultura orgânica nos quintais de casa, nós já estávamos fazendo aqui", lembra dona Gracinha. Mas hoje a comunidade mantém as atividades com apoio do Banco do Nordeste, Banco do Brasil, Organização Barreira Amigo Solidário (OBAS) e da Cáritas Diocesana.

O ano de 2013 poderá ter os efeitos da seca amenizados, ainda que naquele ano chova tão menos quanto neste. Isso pelo menos para as famílias que criarem os quintais produtivos, agora amparado pelos governos Estadual e Federal.

Por meio de convênio assinado entre o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e Secretária do Desenvolvimento Agrário (SDA) serão construídos 5.700 quintais produtivos. Uma parte tendo água a partir do sistema de barragem subterrânea e outros com cisterna calçadão.

Ao todo serão aproximadamente R$ 82 milhões do Governo Federal com contrapartida estadual. A estimativa é de que 67 municípios sejam beneficiados até o final do programa.

COMENTÁRIOS
João Suassuna - josu@fundaj.gov.br
Essas são ações típicas de convivência com o Semiárido. É a prova de que elas funcionam em período de seca. João Suassuna
José do Patrocínio Tomaz Albuquerque - patrociniotomaz@uol.com.br
Prezado João Suassuna
Concordo plenamente com suas palavras. Como esta, existem tantas ações que,
se já tivessem sido implantadas, não veríamos os lamentos e desolações que,
hoje, estão ocorrendo no Semiárido por conta da seca. Alem dessa irrigação
de quintal, poder-se-ia disseminar, onde fossem propícias, outras ações de
convivência com as irregularidades pluviais, gerando alimentos e renda para
os habitantes do meio rural. Projetos, idéias não faltam. Além das que
defendemos em relação à micro, pequena e média açudagem, citam-se os
projetos Mandala, Base Zero, cisternas de vários objetivos, barragens
subterrâneas, poços em aqüíferos aluviais (mais que no Cristalino, sendo
este sistema a última alternativa de suprimento hídrico da população humana,
mais adequado à dessedentação de animais) e, para conseguir um
desenvolvimento socioeconômico mais amplo, incremento, melhoramento,
implantação dos cultivos e outras atividades constantes defendidas pelo
ilustre amigo, Manoel Bonfim Ribeiro, em seu livro " A Potencialidade do
Semiárido Brasileiro". No entanto, os governos vão pela contra-mão das
características fisiográficas da região (hidroclimatologia, pedologia,
geologia, morfologia, etc.) e, além de não promoverem essas ações (com
pequenas e esporádicas exceções) ainda, em alguns casos, as desestimulam.
Outro dia, vi um vídeo em que moradores situados nas proximidades de canal
(acho que era o do trabalhador) no Ceará, eram impedidos, com certa
truculência (havia ação policial, de retirar uma lata de água para seu
consumo, sob o argumento de que poderia faltar na cidade para onde a água
era transportada. Uma falta total de sensibilidade, de conhecimento e um
desrespeito à Lei 9.433/1997 (prioridade para o abastecimento humano) e,
principalmente, à Constituição (art. 1º- todos são iguais perante a Lei).
Mais recentemente, deparei-me com notícia veicula no UOL, de cunho
semelhante, da qual retirei a fotografia que lhe encaminho, onde se comprova
ação de governo em que considera o pobre agricultor (não é um "coronel", a
julgar pelas imagens retratadas) um contraventor. Isso, que este governo,
policialescamente, está a proibir, é que deveria ser incentivado. Não sei se
essa irrigação "baldal" iria comprometer o abastecimento de alguma cidade
(talvez, no caso, Exu em Pernambuco). Mas, pela fotografia, a gleba irrigada
situa-se às margens de um riacho com depósitos aluviais. Isto significa que
aí pode estar embutida uma boa zona aqüífera (não há indício de salinização
nos aluviões) que poderia suprir, com folga, esta e outras demandas desse
tipo (e mais algumas outras) na área em questão. Ou, em caso negativo, seria
possível, após estudos, construir uma barragem subterrânea neste trecho.
Nada disso se faz, ou por desconhecimento, ou por desídia.
José do Patrocínio Tomaz Albuquerque é Hidrogeólogo e professor aposentado da Universidae Federal de Campina Grande.
Anexos
(irrigacao baldal.jpg - 64.18 Kb)
por João Suassuna— Última modificação 01/06/2012 15:42

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