Recuo para evitar fiasco maior.
Heitor Scalambrini
Costa.
Professor da
Universidade Federal de Pernambuco
Ao editar a medida provisória 579 em 11 de setembro último,
que trata da renovação das concessões do setor elétrico e da redução de preços
nas tarifas de energia, o governo deu um prazo final para a assinatura dos
aditivos contratuais até terça-feira dia 4 de dezembro, para que as empresas
envolvidas decidissem se aceitavam ou não a proposta governamental.
Ao todo estão em jogo, 20 contratos de geração (num total
de 22 mil MW potência instalada – total de usinas hidroelétricas 78,5 mil MW),
nove contratos de transmissão (num total de 85 mil km de linhas – total no
Brasil 103 mil km) e 44 contratos de distribuição que vencem entre 2015 e 2017,
e para os quais o governo ofereceu um valor de indenização para os ativos que a
Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) considerou ainda não amortizados.
Pela proposta, as concessionárias terão um novo contrato, por mais 30 anos,
ficando com uma tarifa que cubra os custos de operação e manutenção e uma taxa
de remuneração de 10% (há controvérsias sobre estes valores impostos pela
Aneel). Sem dúvida a empresa mais afetada, foi a Eletrobrás, estatal federal,
cuja diretoria não entrou em polêmicas públicas com sua controladora, a União.
Desde então, sem nenhuma discussão a priori com os
envolvidos na questão, os responsáveis pelo setor energético no país, sempre
afirmaram, no alto da prepotência e da arrogância, peculiar a estes servidores
públicos, que não modificariam a MP 579. Era reafirmado para quem quisesse
ouvir que o governo não raciocinava com a hipótese de aumentar o valor das
indenizações nem no valor das tarifas.
A reação contrária a MP foi muito grande, e partiu não só
das empresas atingidas (com alguns dirigentes se pronunciando contrários às
medidas anunciadas), mas também da academia, de especialistas do setor
elétrico, de sindicatos de trabalhadores e de várias organizações não
governamentais. Além do governo federal os únicos defensores da MP 579 foram a
Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação das
Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) que lançaram uma campanha publicitária -
nos jornais e na televisão, e mais recentemente a Confederação Nacional das
Indústrias (CNI).
A pressão das empresas e de seus controladores surtiu
efeito. Levou o governo a editar uma outra medida provisória a MP 591 (29/11)
que reconheceu os investimentos em linhas de transmissão anteriores a maio de
2000, e que não tinham sido levados em conta anteriormente, pois eram
consideradas totalmente amortizadas. Também editou a portaria interministerial
MME-MF nº 602 (29/11), com os valores retificados das indenizações referentes
às usinas hidrelétricas a serem pagas aos concessionários de geração. Os valores
de ressarcimento de geração foram corrigidos e levados em conta os gastos que
elas tiveram ao construir suas usinas hidrelétricas, reconhecendo assim os
chamados “custos retardários” (modernização de turbinas, contingências
judiciais por desapropriações, investimentos sócio-ambientais ao longo do
período de concessão, ....). Quando definiu o cálculo das indenizações para as
geradoras, o governo usou a metodologia conhecida como Valor Novo de Reposição
(VNR), que remetia para os custos de hoje o quanto às empresas gastaram no
momento de construir seus ativos. Segundo técnicos governamentais a alteração
na metodologia pode levar a um acréscimo de até 10% no VNR. E nas vésperas do
chamado dia “D” (3/12) oficializou através do decreto no 7850, um
novo incentivo às empresas para que renovem antecipadamente seus contratos de
concessão. As companhias geradoras terão agora até o fim de 2013 para fornecer
informações complementares sobre os investimentos realizados em seus ativos e,
assim, se tornarem elegíveis a novas compensações oferecidas pelo governo. A
nova compensação poderá vir na forma de reajuste nas indenizações pagas pelo
governo ou com um aumento tarifário.
Mesmo com estas medidas as assembléias gerais de acionistas
das empresas como a CESP, CELESC, COPEL, CEMIG decidiram não renovar as
concessões. Já empresas como a Eletrobrás com cerca 30% da capacidade instalada
total da companhia e no caso das subsidiárias Eletrobras Chesf e Eletrobras
Furnas, respectivamente, 86,8% e 38,3% de sua capacidade instalada, decidiram
por renovar suas concessões. Já algumas empresas se anteciparam em anunciar a
decisão de renovar as concessões como foi o caso da Companhia Paranaense de
Energia (Copel) e da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) do Rio Grande do Sul.
Agora resta as empresas aguardarem a tramitação da MP 579
no Congresso Nacional para manifestarem o interesse pela renovação dos
contratos de concessão que poderá sofrer modificações (pouco provável). Do
ponto de vista dos trabalhadores destas empresas, sem dúvida, sofrerão em breve
os reflexos das contenções de despesas que certamente ocorrerão por parte das
empresas, que já reativaram seus planos de demissões voluntárias e
incentivadas.
De toda maneira fica uma lição deste episódio, a
necessidade mais que urgente de se democratizar as decisões tomadas pelo
governo federal responsável pelo setor elétrico, tão estratégico para o país.
Certamente fica também constatado que para as empresas sempre haverá a
possibilidade do governo recuar, mas para os trabalhador@s, .....
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