Rio São Francisco pode ser extinto, diz biólogo.
Após quatro anos de monitoramento
do rio e das obras de transposição de parte das águas do São Francisco, o
biólogo José Alves Siqueira, 41, e outros 99 pesquisadores alertam: o rio está
em processo de "extinção inexorável".
Governo afirma que área afetada por transposição será recuperada
O professor integra a equipe da Univasf
(Universidade Federal do Vale do São Francisco), em Petrolina (PE), contratada
pelo governo federal para fazer o inventário da flora e da fauna ao longo de
todo o trecho da obra.
Divulgação
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O biólogo José Alves de Siqueira, da Univasf (Universidade
Federal do Vale do São Francisco)
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O resultado encontrado no rio e nos 469
quilômetros de canais está no livro "Floras das Caatingas do Rio São
Francisco: História Natural e Conservação" (Andrea Jackobsson Estúdio).
Leia os principais trechos da entrevista.
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Folha - O título do primeiro capítulo do
livro assusta: "A extinção inexorável do rio São Francisco". Como
vocês identificaram esse processo e por que o consideram inexorável?
José Alves Siqueira - Eu fiz uma
pesquisa minuciosa sobre todos os problemas históricos que ocorreram no São
Francisco desde o seu descobrimento. A gente teve um dos rios mais piscosos do
país. Com as barragens [Três Marias, Sobradinho, Paulo Afonso e Xingó], a gente
perdeu todos aqueles peixes que sobem as corredeiras para se reproduzir. O São
Francisco é o rio mais barrado do Brasil.
Se as coisas continuarem do jeito que
estão, quanto tempo o São Francisco ainda tem?
A gente não tem como fazer um cálculo preciso. O
processo está em curso, o rio está sofrendo profundamente com o desmatamento de
suas matas ciliares.
Qual a participação da transposição neste
processo?
Existe um passivo ambiental da obra, em torno de
R$ 20 milhões, R$ 25 milhões. Esse recurso deve ser usado para implementar
unidades de conservação. Podemos transformar o problema da transposição numa
oportunidade.
Na prática, como a obra da transposição
está colaborando com o processo?
Ainda não temos as respostas claras. A gente
encontrou 62 espécies exóticas invasoras, que não são da flora brasileira, já
nas áreas do canal. Quando ela [a invasora] chega, ocupa espaço de espécies
nativas e provoca destruição das outras.
O senhor é favorável à obra?
A gente não está discutindo se é a favor ou
contra porque a obra já está em curso. Hoje o nosso papel é tentar mitigar os
impactos. Os impactos existem. [Mas] o que a gente pode fazer para tornar isso
razoavelmente viável?
O senhor fala que ainda tem muito a se avançar nesse processo de mitigação dos impactos. Como?
Algo para ser feito em caráter emergencial [é] a
implementação dos programas de recuperação de áreas degradadas. As grandes empreiteiras
têm obrigação de implementar esses planos de recuperação. Isso não está
acontecendo. Quando oferecem a possibilidade de fazer, fazem com espécies
exóticas invasoras. A gente tem um conjunto de oportunidades que não pode
perder vista. Não teremos uma segunda oportunidade. Não há nada de
sensacionalista nisso. Não é uma crítica gratuita.
Qual o papel dessa estiagem prolongada no Nordeste neste processo de extinção do rio?
É mais um agravante porque a demanda por água
aumenta. Os bancos de areia no São Francisco estão cada vez maiores. A gente
está vivendo um processo de aquecimento global e a caatinga é o lugar do Brasil
mais suscetível a essas mudanças climáticas.
Colegas:
A caatinga e o cerrado, floristicamente relacionados com a mata atlântica, estão sendo dizimados, como todas as outras formas da mata atlântica.
A produção de lenha comanda a destruição, legal ou ilegalmente, e, em seguida, agricultura, produção mineral, coleta vegetal e expansão urbana.
O fogo e a caça são presenças constantes e avassaladoras.
Já se destruiu demais dessas formações insubstituíveis, da qual dependem milhares de espécies animais e vegetais exclusivas, ou que tem aí contingentes populacionais importantes.
Pouquíssimas unidades de conservação na área da caatinga e do cerrado, de extensão reduzida, altamente desconectadas, parcas de recursos e de servidores e repletas de espécies exóticas invasoras, não garantem conservação perene nem mesmo das espécies abundantes e comuns, quanto mais do “tatu-bola” e de outras espécies raras, endêmicas e ameaçadas.
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