segunda-feira, 9 de junho de 2014
TRANSPOSIÇÃO DE ÁGUAS DO RIO SÃO FRANCISCO: planejar é preciso, artigo de João Suassuna
Saga da Transposição do Rio São Francisco - Artigo 25 - 10/09/2001
http://www.fundaj.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=661&Itemid=376
Que as conseqüências das secas sirvam de lição para a necessidade de se planejar melhor as ações estruturadoras no Semiárido nordestino.Cenários controvertidos.
A realidade hídrica, principalmente nos aspectos atinentes à oferta e uso das águas, é tema que, historicamente, tem marcado o debate sobre o Semiárido nordestino. Essas preocupações têm motivado os pesquisadores a se concentrar na busca da compreensão existente entre o clima, o solo, a água e as plantas e sua importância para a população.
Após o agravamento da crise de abastecimento hídrico do Nordeste no ano de 1995, a transposição de águas do rio São Francisco passou a ser vista como a única alternativa possível de solução desse problema. Atualmente, existem dois cenários bem definidos com relação ao tema. O primeiro é o cenário do imediatismo, caracterizado pela ânsia de fazer chegar água, a todo custo, nas torneiras da população (pensamento muito comum na classe política), sem haver, no entanto, a preocupação com as consequências impostas ao ambiente ao se adotar essa alternativa; o segundo é o cenário da ponderação, caracterizado por preocupações constantes (principalmente no meio técnico) com relação às limitações das fontes hídricas na condução do processo transpositório. O primeiro cenário diz respeito às questões do Brasil virtual ou oficial e, o segundo, às questões do Brasil real.As observações realizadas nesse relato estarão contidas no cenário do Brasil real.
Quantitativos hídricos.
Para o tratamento mais adequado das questões hídricas do nosso planeta é imperioso visualizarmos melhor a forma de distribuição das águas nas suas diversas regiões.
O planeta Terra é constituído de, aproximadamente, 1.370.000.000 km³ de água, distribuídos em 2/3 de sua superfície. Com esse considerável volume, o nosso planeta poderia ser chamado de planeta Água. Desse total, 97% compõem as águas do mares e oceanos, portanto são constituídos de águas salgadas. As águas doces correspondem a, apenas, 3% daquele total. Desse pequeno percentual de água doce existente, 2/3 encontram-se localizados nas calotas polares, portanto com água em estado sólido, não havendo, no momento, tecnologia disponível para ofertá-la às populações. O 1/3 restante corresponde a aproximadamente 1% do volume inicial. Esse é o volume disponível para o consumo da população mundial, estimada hoje em mais de 6 bilhões de pessoas.
O Brasil é um país privilegiado em termos de recursos hídricos. Ele detém cerca de 12% da água doce que escorre superficialmente no planeta. Desses recursos, 72% estão localizados na bacia amazônica, região na qual vivem menos de 8% da população nacional. O Nordeste brasileiro detém míseros 3%, 2/3 dos quais encontram-se na bacia do rio São Francisco.
O quadro 1 trata da disponibilidade per capita de água, em diversas regiões do planeta, inclusive no território nacional. Na primeira classe de disponibilidade (> do que 20.000 m³/hab./ano), estão considerados todos os estados da região norte, sendo Roraima o estado campeão em oferta de água do país. Dos estados nordestinos, pertencentes ao Semiárido, apenas o Piauí está em situação confortável (considerado um estado rico em ofertas hídricas, pelo fato de fornecer volumes superiores a 5.000 m³/hab./ano), fato este advindo de riqueza significativa de água em seu subsolo e da existência de um grande rio perene - o Parnaíba - que faz fronteira com o estado do Maranhão; o estado da Bahia (em situação limite em termos de oferta hídrica, com fornecimentos volumétricos superiores a 2.500 m³/hab./ano), chega a ter mais água do que o estado de São Paulo, por ser beneficiado pelas águas do rio São Francisco e possuir áreas sedimentares esparsas, mas significativas, em seu território. A situação dos demais estados nordestinos é preocupante (pobres em água, pelo fato de fornecerem volumes inferiores a 2.500 m³/hab./ano), destacando-se, entre eles, a Paraíba e Pernambuco, como estados campeoníssimos em baixa oferta hídrica para os seus habitantes, cabendo a este último o fornecimento de apenas 1.320m³/hab./ano.
Quadro 1 - DISPONIBILIDADE DE ÁGUA
Disponibilidade
hídrica
per capita
m³/hab./ano País Disponibilidade
hídrica
per capita
m³/hab./ano
Estado
brasileiro Disponibilidade
hídrica
per capita
m³/hab./ano
Abundante
> 20.000 Finlândia
Suécia
22.600
21.800 Roraima
Amazonas
Amapá
Acre
MatoGrosso
Pará
Tocantins
Rondônia
M.G do Sul
Goiás
Rio G. do Sul 1.747.010
878.929
678.929
369.305
258.242
217.058
137.666
132.818
não disponível
não disponível
20.798
Muito rico
> 10.000 Irlanda
Luxemburgo
Áustria 14.000
12.500
12.000 Maranhão
Sta. Catarina
Paraná
Minas Gerais 17.184
13.662
13.431
12.325
Rico
> 5.000 Portugal
Grécia
6.100
5.900 Piauí
Espírito Santo 9.608
7.235
Situação limite
> 2.500 França
Itália
Espanha 3.600
3.300
2.900 Bahia
São Paulo 3.028
2.913
Pobre
< 2.500 Reino Unido
Alemanha
Bélgica 2.200
2.000
1.900 Ceará
Rio de Janeiro
Rio G. do Norte
Alagoas
Distrito Federal
Sergipe 2.436
2.315
1.781
1.752
1.751
1.743
Situação crítica
< 1.500 Paraíba
Pernambuco 1.437]
1.320
Fonte: Secretaria de Recursos Hídricos de São Paulo - 2000
Fragilidad eambiental.
Qual a razão dessa miséria hídrica nos estados nordestinos? O grande responsável por toda essa adversidade existente é o próprio ambiente natural da região, principalmente por seus condicionantes climáticos e geológicos, agravado ainda pela ação inconsequente de seus habitantes (estima-se no Semiárido uma população de cerca de 20 milhões de pessoas, das quais, no exacerbar de uma seca, 10 milhões passam sede e fome).
Geograficamente falando, o Nordeste brasileiro está localizado muito próximo à linha do equador. O Recife está situado a 8° graus de latitude sul. Fortaleza encontra-se a 3° graus. Isso significa que os raios solares incidem de forma perpendicular à linha do solo, fenômeno este que tem influência significativa não apenas na elevada temperatura do ambiente (a média da região é de 26° C) mas, e principalmente, na evaporação e na insolação (evaporam-se no Semiárido mais de 2.000 mm/ano e a região dispõe de mais de 2.800 horas de sol/ano).
Apesar de sofrer a influência de diversas massas de ar formadoras de seu clima (Equatorial Atlântica, Equatorial Continental, Tépida Atlântica, Tépida Kalaariana e Polar), o Nordeste tem clima semiárido em mais da metade de sua área, porquanto essas massas de ar adentram a região com pouca energia, trazendo consequências danosas não apenas pelo baixo volume de chuvas caídas, mas também pela periodicidade irregular dessas precipitações. O quadro 2 mostra alguns exemplos da irregularidade na caída das chuvas no município de Souza, na Paraíba, em anos considerados secos, citados por Guimarães Duque no seu livro "O Nordeste e as Lavouras Xerófilas". Nele observa-se que, no ano de 1941, o total de chuvas caídas foi de 674 mm. No mês de março daquele ano choveu 309 mm, ou seja, 45% do precipitado em todo o ano, e a chuva em um único dia no mês de março foi de 125 mm, ou seja, 40% do que choveu durante todo o mês. Esse aspecto bem demonstra a anormalidade climática da região, tendo a mesma voltado a se repetir nos anos de 1942, 1951, 1953 e 1958.
Ainda com relação às secas, outros fenômenos merecem ser citados: o El Niño, caracterizado pelo aumento de temperatura no Pacífico, próximo às costas do Peru, que provoca deslocamentos de correntes aéreas entre os estados de São Paulo e Paraná, impedindo a subida das frentes frias oriundas da região polar, que interferem nas precipitações do Nordeste, e a variação nas temperaturas do Atlântico, nas suas partes norte/sul, próximas ao litoral nordestino, que também exerce influência significativa na caída das chuvas na região, havendo possibilidades de bom período chuvoso, quando as temperaturas na sua parte sul encontram-se mais elevada, quando comparadas àquelas de sua parte norte.
Com relação à geologia, no Nordeste existem dois grandes conjuntos estruturais: o Escudo Cristalino e as Bacias Sedimentares.
O Escudo Cristalino, que representa cerca de 70% da área semiárida nordestina, é constituído por solos geralmente rasos, nos quais as rochas que lhes dão origem estão praticamente à superfície, chegando a aflorar em alguns pontos. Essas características resultam em baixa capacidade de infiltração de água nesses solos e, por conseguinte, alto escorrimento superficial e reduzida drenagem natural. As únicas possibilidades de existência de água nesse tipo de estrutura encontram-se: nas fraturas das rochas cristalinas e nos aluviões próximos a rios e riachos. As fontes hídricas em tais condições normalmente têm baixa vazão e, como se isso não bastasse, as águas são extremamente ricas em sais.
Um rio que corre sobre o cristalino apresenta-se, na época das chuvas, com muita água, e, dependendo do volume de água caído, com enchentes descomunais. Uma vez encerradas as chuvas, volta ao seu leito normal, diminuindo a vazão paulatinamente e, em determinada época do ano, interrompe o seu curso. É um rio temporário. O melhor exemplo a ser citado de um rio que corre sobre o escudo cristalino, na região semi-árida, é o Jaguaribe, no Ceará, considerado o maior rio seco do mundo.
Quadro 2 - IRREGULARIDADE NA CAÍDA DAS CHUVAS
Paraíba - Município de Souza - Açude de São Gonçalo
Ano de 1941 (considerado seco)
Chuva total do ano
Chuva total do mês de março
Chuva total do dia 6 de março 674 mm
309 mm (45% do ano)
125 mm (40% do mês)
Ano de 1942 (considerado seco)
Chuva total do ano
Chuva total do mês de abril
Chuva total do dia 10 de abril 468 mm
207 mm (44% do ano)
93 mm (44% do mês)
Ano de 1951 (considerado seco)
Chuva total do ano
Chuva total do mês de abril
Chuva total do dia 23 de abril 726 mm
317 mm (43% do ano)
115 mm (36% do mês)
Ano de 1953 (considerado seco)
Chuva total do ano
Chuva total do mês de março
Chuva total do dia 26 de fevereiro 563 mm
254 mm (45% do ano)
113 mm
Ano de 1958 (considerado seco)
Chuva total do ano
Chuva total do mês de março
Chuva total do dia 28 de março 535 mm
275 mm (51% do ano)
127 mm (46% do mês)
Diante dessas características do ambiente cristalino, entendem-se as razões que possibilitaram uma verdadeira corrida para a construção de açudes nessa região. Hoje é estimada, no Nordeste, a existência de mais de 70.000 açudes, os quais são responsáveis pelo represamento de cerca de 30 bilhões de m³ de água (a represa de Sobradinho está excluída dessa estatística por ser considerada o maior lago artificial do Nordeste e de possuir, sozinho, cerca de 34 bilhões de m³ de água). É o maior volume de água represada em regiões semiáridas, no mundo. Apesar de possuir um volume de água considerável, pesa sobre a região uma triste estatística: as 24 maiores represas têm capacidade de acumular 12,7 bilhões de m³, mas apenas 30% desse volume são utilizados na irrigação e no abastecimento das populações. Os 70% perdem-se com a evaporação. Por sua vez, a represa Armando Ribeiro Gonçalves, a segunda maior do Nordeste (a primeira é Sobradinho), localizada no município de Açu, no Rio Grande do Norte, com capacidade de acumular 2,4 bilhões de m³, é subutilizada. Estima-se que ela tenha condições de abastecer toda a população do estado do Rio Grande do Norte nos próximos 20 anos, se considerado um consumo médio de 200 litros/pessoa/dia. Mesmo sendo portadora de riqueza volumétrica significativa, está previsto o seu abastecimento com as águas oriundas do São Francisco, pelo projeto transpositório que se encontra, atualmente, em curso. Esse fato pode ser comparado a uma chuva que se precipita no molhado, se observada a situação de penúria hídrica em que se encontra todo o Seridó norte-rio-grandense, região na qual existem reais necessidades de abastecimento e que não foi contemplada com uma gota sequer das águas do Velho Chico.
Já nas Bacias Sedimentárias, as condições naturais são opostas àquelas do Escudo Cristalino. Normalmente, são caracterizadas pela existência de solos profundos, porosos, com alta capacidade de infiltração, baixo escorrimento superficial e boa drenagem natural. Essas características possibilitam a existência de um grande suprimento de água, de boa qualidade, no lençol freático dessas bacias. No Nordeste, esse conjunto está localizado em cerca de 30% da região semiárida. Pelo fato de representar um percentual muito pequeno, em relação à área total do Nordeste, vale aqui um alerta: não é conveniente se extrapolarem os exemplos de riquezas hídricas existentes nas áreas sedimentárias, para o Nordeste como um todo. São recursos hídricos importantes, sem a menor sombra de dúvidas, mas essas águas devem ser exploradas com eficácia e utilizadas com muita parcimônia, evitando-se. Devem ser evitados os maus exemplos de desperdícios, como aqueles existentes no município de Cristino Castro, região do Vale do Gurguéia, no sul do Piauí, onde poços jorram noite e dia, sem que se saibam os usos que são dados à água.
Quais as características de um rio que tem seu leito sobre o sedimentário? Pelo fato de ocorrerem infiltrações significativas e boa drenagem natural nos solos, os rios, em tais circunstâncias, têm constantemente seus volumes enriquecidos, tornando-se perenes. Nesse aspecto, o melhor exemplo é conferido ao rio Parnaíba que separa os estados do Piauí e Maranhão.
Aldo da Cunha Rebouças, no trabalho "Panorama da Degradação do Ar, da Água Doce e da Terra no Brasil", publicado em 1997 através do CNPq, entre outras análises, mostra os quantitativos volumétricos existentes no subsolo dos principais domínios hidrológicos do Brasil. Nesse trabalho, são destacados os volumes existentes nas bacias sedimentares nordestinas, bem como aqueles existentes no seu escudo cristalino. O quadro 3 evidencia a grande diferença volumétrica existente entre os referidos domínios, cabendo ao escudo cristalino (600.000 km² de área), pertencente ao aquífero principal Zonas Fraturadas, um volume estimado de apenas 80 km³, enquanto na Bacia sedimentar do Maranhão (700.000 km² de área), pertencente ao aquífero principal Arenito Itapecuru, Ar. Cordas-Grajaú, Ar. Motuca, Ar. Poti-Piauí, Ar. Cabeças e Ar. Serra Grande, um volume significativamente maior, estimado em cerca de 17.500 km³ de água. Esses dados mostram que aproximadamente 70% das águas de subsolo existentes no Nordeste, estão localizadas nos estados do Maranhão e do Piauí.
Levando esses conceitos em consideração, ao ser analisada a transposição de águas em si, observa-se que o rio São Francisco corre, por toda a extensão do Semiárido, sobre uma geologia cristalina. Esse fato faz com que todos os seus afluentes apresentem, nessa região, regimes temporários, o que resulta em significativas limitações de vazão, no período de estiagem. Esse aspecto condiciona ao rio uma vazão média histórica da ordem de 2.800m³/s.
O rio tem aproximadamente 2.700 km de extensão, entre o seu nascedouro, na Serra da Canastra (MG), e a sua foz, no pontal do Peba (AL). Ele é subdividido em ALTO (da Serra da Canastra até Pirapora), MÉDIO (de Pirapora até Remanso), SUBMÉDIO (de Remanso até Paulo Afonso) e BAIXO São Francisco (de Paulo Afonso até o Oceano Atlântico). Tudo que ocorre ao longo de todo o rio São Francisco é reflexo do que acontece na sua parte ALTA. É lá onde ocorrem as precipitações que irão abastecer a represa de Sobradinho, responsável direta pela regularização da vazão do rio; é onde são formadas as cheias necessárias para manutenção da vida na parte ribeirinha do rio; é onde a pesca e a navegação se fazem com maior intensidade e é, portanto, a região na qual se deveria ter um tratamento diferenciado por parte de nossas autoridades, o que, na realidade, não vem acontecendo.
Através dos comentários acima, percebe-se o quanto o Nordeste semiárido é frágil em termos ambientais, provavelmente não existindo, com tais características, outra região similar em zonas tropicais de todo o mundo. Somem-se a essas questões, secas sucessivas e uma total falta de planejamento, por parte de nossas autoridades, no usos dos recursos hídricos... O resultado é o que estamos presenciando atualmente no Nordeste: cidades de certo porte como Caruaru (PE) e Campina Grande (PB), com racionamentos de água significativos; cidades como Arcoverde (PE) e Bezerros (PE) com colapso no abastecimento e em estado de calamidade pública, havendo necessidade da intervenção do governo, através do uso de carros-pipa e do envio de um trem carregado com 300.000 litros de água para o abastecimento das populações e, o exemplo mais marcante, a cidade do Recife, com mais de 3 milhões de habitantes em sua região metropolitana, que chegou a ter um racionamento de 9 dias sem água, intercalados com um dia com água em alguns bairros. Essa situação de Recife é lamentável, porquanto a cidade se encontra sobre uma geologia sedimentária riquíssima em água e localizada numa região onde chove, em média, 2.000 mm/ano.
Quadro 3 - PRINCIPAIS DOMÍNIOS HIDROLÓGICOS DE ÁGUA DOCE SUBTERRÂNEAS E INTERVALO DE VAZÃO DE POÇOS NO BRASIL.
Domínio Aqüífero Área
(km²) Sistema Aqüífero
Principal Volume
d’água (km³)
Intervalo Vazão de Poço
(m³/h)
Substrato Aflorante 600.000 Zonas fraturadas 80 < 1 - 5
Substrato Alterado 4.000.000 Manto rochas alteradas
e/ou fraturas 10.000 5 - 10
Bacia Sedimentar Amazonas 1.300.000 Ar. Barreiras
Ar. Alter do Chão 32.500 10 - 400
Bacia Sedimentar
São Luís/Barreirinhas 50.000 Ar. São Luís
Ar. Itapecuru 250 10 - 150
Bacia Sedimentar
Maranhão 700.000
Ar. Itapecuru
Ar. Cordas-Grajaú
Ar. Motuca
Ar. Poti-Piauí
Ar. Cabeças
Ar. Serra Grande 17.500
10 - 1000
Bacia Sedimentar
Potiguar - Recife 23.000 Ar. Barreiras
Calcário Jandaíra
Ar. Açu-Beberibe
230
5 - 550
Bacia Sedimentar
Alagoas - Sergipe 10.000 Ar. Barreiras
Ar. Marituba 100 10 - 350
Jatobá-Tucano-Recôncavo 56.000 Ar. Marizal; Ar. Tacaratu;
Ar. São Sebastião 840 10 - 500
Bacia Sedimentar
Paraná (Brasil) 1.000.000 Ar. Baurú-Caiuá Basaltos
S.Geral; Ar. Furnas/Aquidauana
Ar. Botucatu-Piramboia-R.Branco
50.400
10 - 1700
Depósitos Diversos
773.000
Aluviões, dunas
411 2 - 40
Totais 8.512.000 @ 112.000
O Projeto
Para resolver o problema de penúria hídrica do Nordeste, coube ao governo federal elaborar uma proposta, que consistia no transporte de águas do rio São Francisco para as regiões necessitadas, aproveitando o potencial de oferta hídrica supostamente disponível no rio (o Nordeste possui apenas 3% de toda a água doce existente no País, 2/3 dos quais se encontram na bacia do São Francisco), conforme comentado no início deste relato.
O plano de usar as águas do rio São Francisco para resolver tais problemas, nos estados de Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte, remonta ao século XIX. Foi em 1886 que o engenheiro Tristão Franklin Alencar de Lima cogitou, pela primeira vez, nessa ideia. Desde então, muitas outras propostas surgiram, mas em nenhuma foi comprovada eficácia suficiente que justificasse sua execução.
Em 1985, novas alternativas foram estudadas pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs). Cogitou-se, inclusive, na interligação da Bacia do Tocantins com o Velho Chico. Há sete anos, um outro projeto fracassou. Dessa vez, a ideia do então ministro da Integração Regional, Aloísio Alves, era transportar 280 m³/s de água do São Francisco para quatro estados nordestinos.
A proposta atual prevê, em duas tomadas d’água, a retirada de 127 m³/s a partir da cidade de Cabrobó (PE), eixo norte (de onde serão bombeados até 99 m³/s) e do lago de Itaparica (BA), eixo leste (de onde sairão os 28 m³/s restantes). No Ceará, o rio Jaguaribe e bacias metropolitanas de Fortaleza seriam interligadas pelo Canal do Trabalhador. No Rio Grande do Norte, os rios beneficiados seriam o Apodí e o Piranhas-Açu. Na Paraíba, as águas do Velho Chico alimentariam as vazões dos rios Piranhas e Paraíba. Em Pernambuco, os rios Brígida e Moxotó seriam contemplados.
Para as águas alcançarem as vertentes dos referidos estados, teriam que ser elevadas a 164 metros de altura, no eixo norte, e 304 metros no eixo leste; passarem por túneis e aquedutos e percorrerem dois mil quilômetros de rios e canais a céu aberto, com perdas por evaporação e infiltração. Porém, o bombeamento não seria contínuo, pois o objetivo do projeto visa tão somente suprir alguns açudes para compensar a água evaporada, abastecendo mais de seis milhões de pessoas e irrigando cerca de 300 mil ha de terra a 500 km de distância das margens do rio.
Com os múltiplos usos existentes, será que o rio dispõe ou poderia dispor de água suficiente para suprir essas metas? Com vistas a responder a essa indagação, é necessário tecer alguns comentários sobre a situação em que se encontra a bacia do São Francisco na atualidade.
Rio doente
A bacia do São Francisco abrange uma área aproximada de 640.000 km², em que existem cerca de 500 municípios, dos quais 97 em suas margens, e uma população estimada em cerca de 14 milhões de pessoas.
A primeira questão a ser observada é a poluição existente em suas águas. Pode-se imaginar as consequências ambientais advindas do despejo diário dos esgotos domésticos desse significativo contingente populacional na calha do rio. A grande Belo Horizonte, por exemplo, despeja diariamente seus esgotos - domésticos e industriais - no rio das Velhas e no Paraopeba, importantes afluentes do São Francisco. Trata-se de um problema de saúde pública que terá que ser solucionado, antes mesmo de se fazer uso de suas águas.
Os desmatamentos indiscriminados são outro fator que merece atenção especial na sua bacia. As siderúrgicas mineiras consomem anualmente cerca de 6 milhões de toneladas de carvão vegetal, 40% dos quais oriundos das matas nativas da região. A remoção dessa biomassa para uso industrial tem causado danos significativos ao ambiente: estima-se que 75% das florestas nativas do estado de Minas Gerais, bem como 95% das matas ciliares da bacia do São Francisco tenham sido destruídas.
A expansão da fronteira agrícola, no Noroeste mineiro e em todo o Oeste baiano, principalmente com o plantio do café e da soja irrigados, é outro fator que tem causado danos significativos ao São Francisco. Em regiões possuidoras de uma malha fluvial importantíssima para a regularização da vazão do rio, os desmatamentos praticados, principalmente nas cabeceiras de alguns de seus afluentes, têm ocasionado, com certa frequência, exaustão de nascentes, com consequente diminuição de vazão do Velho Chico, como ocorreu recentemente com os rios Cabeceira Grande, Sucuriú, Capão e Ribeirão do Salitre, todos pertencentes à bacia do rio Corrente, importante tributário do São Francisco. Desprovida de vegetação ciliar, as margens desses rios ficam sujeitas à erosão, trazendo, como consequência, assoreamentos em seus leitos, o que dificulta a navegação. Estima-se que estejam sendo carreados anualmente para o leito do Velho Chico, cerca de 18 milhões de toneladas de solos, volume equivalente a 2 milhões de caminhões caçambas. As balsas que atravessavam o rio, na altura de São Romão (MG) foram impedidas de navegar, devido à formação de bancos de areia naquela localidade, obrigando os usuários a proceder a travessia em um pequeno lugarejo à sua montante, denominado Cachoeira do Manteiga.
Estes comentários são importantes, como formadores de opinião sobre a realidade da região sanfranciscana, e mostram a necessidade de se empreenderem ações estruturadoras e revitalizadoras no rio.
Ações antrópicas
Dois aspectos importantes que devemos levar em consideração para o entendimento da situação em que se encontra a bacia do São Francisco, estão relacionados com as ações desenvolvimentistas realizadas pelo homem. O primeiro diz respeito à exploração do potencial irrigável do rio, estimado em cerca de 3 milhões de hectares, nos quais já foram implantados cerca de 340 mil hectares, ao longo de toda a sua bacia. Considerando-se, para fins de cálculo do consumo de água, 0,5 litro por segundo para irrigar 1 hectare, a exploração dessa área já utiliza atualmente cerca de 170 m³/s das águas do rio.
O outro aspecto a ser considerado diz respeito à implantação do programa de eletrificação do Nordeste pela Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf). A um custo estimado em cerca de 13 bilhões de dólares, a Chesf, ao longo dos últimos 60 anos, explorou, com muita competência e através da saga de um povo, todo o potencial gerador do rio, contando, atualmente, com cerca de 10 mil MW/h instalados. Todo o complexo gerador da Chesf utiliza, do São Francisco, uma vazão mínima garantida de aproximadamente 2.060 m³/s.
A construção das represas das usinas geradoras acarretou enormes problemas para a atividade pesqueira da região. As espécies de piracema estão desaparecendo do rio, devido à impossibilidade que têm de fazerem o seu trajeto natural de subida das corredeiras, para a realização das desovas. Ademais, as águas no interior das represas tiveram a turbidez e a temperatura modificadas, confundindo a fisiologia das fêmeas e abortando as desovas. Ainda com relação a essas questões, o sistema Chesf, após a construção das represas, regularizou a vazão do São Francisco. Esse aspecto fez com que começassem a existir críticas muito fortes, por parte dos que habitam as localidades ribeirinhas, os quais alegam que o rio está correndo com pouca água. Isso despertou o imaginário das pessoas no sentido de começar a entender a razão da captura de peixes de espécies marinhas, como o camurim e o xaréu, em localidades distantes do estuário do rio, como vem ocorrendo no município de Porto Real do Colégio, a aproximadamente 100 km de sua foz. Ora, se o peixe de água salgada consegue adentrar a uma distância de 100 km do seu habitat natural, é porque os níveis de sal nas águas do São Francisco estão tão elevados que possibilitam a formação de um ambiente favorável à sobrevivência de tais espécies. Diante desse fato, está-nos parecendo que as incursões das águas do mar para o interior do rio, estão sendo maiores do que as incursões naturais das águas do rio em direção ao mar. Em outras palavras, o rio está perdendo essa luta.
Águas comprometidas
A irrigação de 340 mil ha, praticada atualmente no vale do São Francisco, já vem comprometendo em cerca de 170 m³/s, a vazão média do rio, que é de 2.800 m³/s. Afora esse aspecto, tem-se que levar em conta, também, os volumes utilizados na geração de energia, estimados em cerca de 2.060 m³/s (vazão mínima garantida), bem como os volumes ditos ecológicos - aqueles relativos à evaporação (exacerbada na região semiárida e que subtrai de Sobradinho cerca de 200 m³/s), às infiltrações naturais no solo, às utilizações realizadas pelas plantas e os volumes já comprometidos no abastecimento das populações ribeirinhas - os quais, juntos, podem comprometer a vazão do rio em mais 330 m³/s. Percebe-se, portanto, que, dadas às prioridades de usos múltiplos existentes no São Francisco, a sua vazão média total encontra-se bastante comprometida. Com as subtrações mencionadas, o rio só poderá dispor, para outros usos, de cerca de 240 m³/s (volume estimado pela CODEVASF na proposição de seus projetos), dos quais está prevista a retirada, através do processo transpositório, de até 127 m³/s.
A geração de energia
As questões da geração de energia no Nordeste são de deixar qualquer pessoa que tenha o mínimo bom-senso em verdadeiro estado de pânico. Como se sabe, o São Francisco é responsável por mais de 90% da energia que é gerada na região. Com relação a esse aspecto, criou-se uma situação inédita no país, que ainda não foi corretamente dimensionada pela opinião pública. Em tempos de paz, nenhum governo do mundo jamais colocou o seu país sob risco tão alto como o que existe no Brasil de hoje. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) prevê que chegaremos, em novembro de 2001, com apenas 10% do volume dos reservatórios preenchidos (estima-se que Sobradinho esteja com apenas 5%), a menos que ocorram verdadeiros dilúvios bíblicos, o que é um fato muito pouco provável nas nascentes do São Francisco, nos meses de agosto, setembro e outubro. Do mês de julho até o início de agosto de 2001, operou-se com cerca de 18% do preenchimento dos reservatórios. Talvez o presidente e sua equipe econômica não saibam de uma informação crucial: se chegarmos aos níveis de 10% dos volumes previstos, ignora-se o que poderá ocorrer. As turbinas instaladas no Brasil são programadas para gerar energia em 60 hertz, ou seja, com 60 ciclos por segundo, e só podem fazê-lo nessa frequência, pois todas as máquinas, equipamentos e eletrodomésticos instalados no país estão ajustados a ela. Isso exige que as turbinas mantenham, com estabilidade, uma certa velocidade de rotação. Quando a coluna d’água diminui devido ao esvaziamento dos reservatórios, o peso da água também diminui e o fluxo se torna menos estável, exigindo que as turbinas façam mais esforço para manter a rotação programada (daí a importância de se entender o conceito de volume útil das represas, nas questões da geração elétrica). Se o esforço for excessivo, os sistemas de proteção entram em ação automaticamente, interrompendo a geração. Essas condições predispõem o sistema para os apagões, ou seja, ocorrem quedas súbitas e descontroladas de energia, que podem ser sequenciais, por sobrecarga. Foi o que ocorreu em toda a região sudeste em princípios de 1999. Se o nível de 10% for de fato atingido, o sistema elétrico brasileiro, que já foi referência mundial, não terá mais confiabilidade operacional. Não se trata de hipótese longínqua. Ao contrário, é a mais provável. Em vez de reconhecer a gravidade da crise e trabalhar para enfrentar o pior cenário, o governo federal resolveu apostar nas providências celestiais. São Pedro foi o primeiro a ser culpado pela crise energética que desestabilizou a vida de todos os brasileiros desde maio de 2001. Aos poucos, especialistas verificaram que, de fato, a baixa pluviometria tem-se acentuado nos últimos cinco anos, mas comprovaram que a falta de chuvas não pode ser responsabilizada, sozinha, pelo risco e custo social e econômico do apagão. Em meio ao embate político e jurídico, rastreou-se a culpa também na queda dos investimentos na geração e nas linhas de transmissão de energia, no modelo de privatização das companhias geradoras e na dependência da produção nacional de energia, na sua grande maioria, de fontes hidrelétricas. Em resumo, na ausência de "planejamento" e "gestão" do setor elétrico. Caso chova bastante nos próximos meses (o que é um fato pouco provável, pois a estação é seca no alto São Francisco), passaremos raspando pelo caos, sofrendo os inconvenientes já bem conhecidos por todos nós.
E foi exatamente nesse cenário de seca e, consequentemente, de descompassos volumétricos das represas e da necessidade de racionamento de energia, que o governo federal apostou todas as suas fichas no projeto transpositório do rio. Felizmente, prevaleceu o bom-senso e o projeto foi engavetado, pelo menos temporariamente.
A água necessária
Tendo em vista o total desabastecimento hídrico hoje existente, vivenciado por boa parte da população nordestina, e existindo no rio São Francisco cerca de 70% das águas disponíveis na região nordeste, é de se supor que, uma vez realizada dentro de parâmetros técnicos confiáveis, a transposição de suas águas possa vir a ser considerada como mais uma ferramenta alternativa, dentro das já existentes, com vistas a solucionar tal problema. Aliás, as águas do São Francisco já estão sendo utilizadas em Pernambuco, através da Adutora do Oeste (0,4 m³/s), aduzidas no município de Orocó para o abastecimento da população de Ouricurí, percorrendo uma distância de cerca de 200 km.
Inicialmente, poder-se-ia fazer cumprir o que determina o artigo 21 da Constituição de 1988, no seu inciso XIX, que estabelece a competência da União em instituir um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso. Mais do que produtora de energia, a água é matéria-prima da agricultura e insumo da indústria. É garantia de higiene doméstica e saúde pública. Alguns estados vêm trabalhando muito nos últimos anos para incorporar esses princípios em suas legislações e políticas públicas, criando conselhos estaduais, comitês de bacias, grupos de usuários de água etc., mas, infelizmente, a grande maioria dos estados nordestinos tem sido relapsa com relação a esse assunto. Embora tenhamos uma lei federal que fixa os fundamentos da Política Nacional dos Recursos Hídricos (Lei 9433, de 08/01/1997) e tendo sido, recentemente, criado pelo governo federal o Comitê da Bacia do rio São Francisco, pouco se avançou na incorporação dos princípios que definem esse novo quadro institucional no país. A lei do estado de São Paulo, de 1991, foi a primeira e serviu de base para a Lei das Águas, no âmbito federal, e de modelo a várias leis estaduais.
Como pode faltar água num país tropical de clima úmido que detém a maior descarga de água doce do mundo; que conta com um número enorme de rios perenes em quase todo seu território e com uma reserva de 12% de toda a água potável do planeta?
Existindo os instrumentos legais acima descritos (a instituição de um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e a definição de critérios de outorga de direitos de seu uso), em cuja implementação, infelizmente, até hoje estamos engatinhando, é necessária a realização do planejamento hidráulico da bacia do Velho Chico com a elaboração de um verdadeiro orçamento de suas águas, anualmente revisado em função da sua maior ou menor disponibilidade, que varia a cada ciclo hidrológico, para darmos resposta aos questionamentos de falta de água da região. Esse orçamento iria definir: X m³/s para uso humano e animal; Y m³/s para irrigação na bacia; Z m³/s para geração de energia elétrica; T m³/s para transposição para outras bacias; W m³/s para a indústria, etc. A Agência Nacional da Água - ANA (autarquia com autonomia administrativa e financeira, a qual se encontra vinculada ao Ministério do Meio Ambiente), órgão recentemente criado pelo governo federal, poderá vir a ter um papel fundamental nessas ações, implementando a política nacional de recursos hídricos e gerenciando o sistema, atuando mais diretamente nas bacias federais, isto é, aquelas com rios interestaduais.
Lacunas existentes
Na bacia do São Francisco foram identificados, desde a década de 60, três milhões de hectares potencialmente irrigáveis, e seu aproveitamento tem sido feito de maneira muito lenta. Como explicar que existam, ou que existiram recursos para levar água a centenas de quilômetros de distância, enquanto as terras próximas ao rio permanecem não beneficiadas?
As águas do São Francisco transpostas para os rios Jaguaribe, Apodí, Piranhas-Açu e Paraíba não irão resolver o problema da seca no Nordeste. Como elas chegarão ao nordestino que vive a uma ou duas léguas das margens desses rios? O problema de falta d’água já existe próximo aos rios existentes na bacia do São Francisco e não é verdade que a transposição irá acabar com o fornecimento de água através de carros-pipa.
Considerando a vazão média de bombeamento da transposição de 60 m³/s (poderá haver bombeamentos de até 127 m³/s) e o preço da energia elétrica de R$ 35,00 por Mwh, o custo total de energia a ser gerada mais os custos de bombeamento (já descontada a energia que seria gerada na futura usina do eixo Norte, conforme indicado nos estudos de viabilidade da transposição) ultrapassa anualmente R$ 70 milhões.
Tais estudos de viabilidade informam que, no eixo Norte a água será elevada de uma cota mínima de 325,30 até 490,01, ou seja, uma diferença de nível de 164,71 metros, enquanto no eixo Leste a água será elevada de uma cota de 280,00 até 603,36, portanto uma elevação de 304,36 metros. Haverá energia suficiente para os bombeamentos necessários, quando a região passa pela maior crise energética de sua história, a qual aflige todos os brasileiros?
Qual a efetiva destinação das águas transpostas com o projeto:
- Para consumo humano e animal?
- Para a irrigação?
Quais as perdas por evaporação?
Quais as perdas por infiltração?
Quais os volumes de águas transpostas que chegarão ao mar?
Qual o custo total do empreendimento?
Que parcelas integrarão o preço a ser pago pelos usuários (amortização do investimento e operação, incluindo bombeamento e manutenção)?
Quem irá gerenciar a água transposta?
Quem irá construir, operar e manter o sistema?
Quais as salvaguardas contra especuladores e grileiros?
Quais as defesas previstas para evitar a expulsão de pequenos proprietários e posseiros nas áreas beneficiadas pela transposição?
Ações necessárias
Foi a noção equivocada de abundância de água, entre nós brasileiros, que nos levou ao falso entendimento da inesgotabilidade de nossas reservas hídricas, principalmente as existentes aqui no Nordeste.
Primeiramente, é importante observar que a transposição não pode ser vista como a única alternativa viável para se resolver, de vez, os problemas hídricos da região. Não podemos e não devemos colocar em um plano secundário os investimentos já realizados em outros setores, como por exemplo a geração de energia e a irrigação, visando a solução de tais problemas. Sendo assim, ações estruturadoras precisam continuar recebendo a atenção necessária por parte das autoridades competentes.
Inicialmente, é de vital importância a revitalização do rio, através do reflorestamento das regiões acometidas pelos desmatamentos indiscriminados. A responsabilidade por essa incômoda situação se estende ao desrespeito e descuido das pessoas para com as leis e a lógica da natureza. São os agressivos e silenciosos desmatamentos que impedem a água, oriunda das precipitações naturais, de se infiltrar na terra. Os reflorestamentos são ações necessárias como forma de conter, tanto o processo erosivo do solo como o da exaustão de nascentes, já verificados em várias localidades da bacia do rio São Francisco. Atenção especial deverá ser dada às matas ciliares, como forma de conter os desbarranqueamentos havidos nas suas margens, os quais são vetores dos processos de assoreamentos existentes em seu leito que impedem ou dificultam a navegação.
O monitoramento das vazões do rio é outro ponto merecedor de destaque. Por tratar-se de um rio com múltiplos usos de suas águas, poder-se-iam concretizar ações, no sentido de se proceder a um acompanhamento sistemático das vazões do São Francisco, adotando-se o mesmo critério que vem sendo observados nos açudes do Ceará, nos quais são utilizados sensores nesses corpos d’água para obtenção dos dados volumétricos e seu imediato tratamento em um centro de processamento em Fortaleza. Com efeito, bastaria a distribuição de sensores em pontos estratégicos de sua bacia, notadamente na sua parte ALTA (tudo o que ocorre no São Francisco é consequência do que ocorre nesse setor do rio), para serem obtidos, instantaneamente, em um centro de processamento, os dados de vazão do rio constantemente atualizados.
O tratamento dos esgotos, oriundos das indústrias e dos municípios existentes na sua bacia, é fundamental para possibilitar a utilização das águas do Velho Chico sem riscos para a saúde das pessoas que habitam a região.
É, também, fundamental que se comece a pensar na viabilidade de se transpor águas de outras bacias hidrográficas, para o São Francisco. Sobre essa questão, a transposição de águas do Tocantins é, sem dúvida, um caminho a ser percorrido. Contudo, alguns esclarecimentos precisam ser feitos: primeiramente, é preciso observar que a bacia do Tocantins está localizada em uma cota 333 metros abaixo da cota do divisor de águas da bacia do São Francisco. Isso significa dizer que há necessidade de bombeamentos para a transposição de suas águas, o que implica em custos elevados na realização do projeto. Existem estudos que comprovam a necessidade de haver, pelo menos, quatro estações elevatórias, a um custo estimado em mais de um bilhão de dólares.
Outro aspecto a ser considerado é o destino dado às águas procedentes do Tocantins. Se forem destinadas ao aumento da capacidade de geração de energia elétrica do São Francisco, seria muito mais viável, economicamente, ampliar o potencial gerador da usina de Tucuruí, localizada no rio Tocantins, e transportar parte dessa energia para o Nordeste, através de linhas normais de transmissão.
Seria prudente observar, também, as limitações de vazão dos rios que compõem a bacia do Tocantins. No caso em questão, as águas seriam bombeadas, para o São Francisco, através do rio do Sono (afluente do Tocantins) o qual, nas proximidades de sua nascente, segundo informações precisas de técnicos da Chesf, dispõe de um potencial transpositor da ordem de 50 m³/s, não mais do que isso.
Outra possibilidade está no aproveitamento das águas de duas lagoas (Jalapão e Varedão) existentes no divisor de águas entre as bacias do Tocantins e do São Francisco, localizadas nas proximidades do município de Formosa do Rio Preto, no Noroeste baiano. Segundo Caio Lóssio Botelho, professor da Universidade Estadual do Ceará, já há uma transposição natural, de cerca de 110 m³/s, da lagoa de Varedão para o São Francisco (veja essa possibilidade na internet, no seguinte endereço: http://www.fundaj.gov.br/docs/tropico/desat/lossio.html). Segundo o professor Caio, bastaria um aprofundamento nessa lagoa para haver um incremento significativo de vazão para o Velho Chico, em até 260 m3/s, sem comprometer o sistema Tocantins.
No entanto, a alternativa mais viável de todas, e sem dúvida a mais barata, seria a de transportar as águas do rio Grande para o São Francisco, na altura da represa de Furnas, no sul do estado de Minas Gerais. Nessa represa, também construída em um divisor de águas (Grande/São Francisco), bastaria a construção de uma comporta, em um dos seus diques, para as águas caírem naturalmente no riacho denominado Pium-i e, por gravidade, chegarem ao São Francisco. O problema existente nessa alternativa é que o rio Grande é afluente do rio Paraná, o qual, por sua vez, é um rio de águas internacionais. A esse respeito, existe legislação específica que torna difícil a realização da obra. Ademais, não se sabe a reação do governo de Minas Gerais a esse tipo de proposta.
Outras questões também são merecedoras de apoio, como forma de se tentar minimizar os problemas de abastecimento das regiões sedentas nordestinas.
É preciso que se dê continuidade ao processo de construção de grandes represas na região, fazendo-se, sempre que possível, a interligação de suas bacias, como forma de utilizar melhor as suas águas. A perfuração de poços em regiões sedimentárias é outra alternativa importante, a qual deve ser apoiada conjuntamente com a ampliação do programa de construção de cisternas no meio rural, principalmente para o atendimento das comunidades carentes, e com as pesquisas na reutilização de águas servidas para o usos menos nobres, tais como aguar jardins, lavar calçadas, automóveis, dar descargas em sanitários etc.. É preciso, contudo, que se ponha em prática a cobrança da água, prevista no Código das Águas de 1934, que já estabelecia a água como um bem público e, portanto, sujeita a outorga e a cobrança, prevendo-se o destino do dinheiro cobrado em aplicações nas próprias bacias.
Finalmente, é importante destacar que a crise energética trouxe uma lição para o país. A de que, com planejamento, coordenação e envolvimento da opinião pública, é possível obter resultados expressivos em qualquer área do conhecimento. No caso específico do chamado Ministério do Apagão foi definido um objetivo: a redução do consumo de energia. Depois, definiu-se uma meta: reduzir em 20% o consumo dos brasileiros e, posteriormente, definiram-se as ações, com cada consumidor recebendo a sua meta de consumo de energia. O coordenador do Ministério, ao divulgar semanalmente os resultados obtidos, ajudou a criar o necessário envolvimento de toda a população, tornando possível, com a adoção desse plano, livrar o país dos chamados apagões.
por João Suassuna — Última modificação 07/05/2014 09:58
CÂMARA REJEITA EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO DEFINITIVO DE REJEITOS RADIOATIVOS PARA CONSTRUÇÃO DE FUTURAS USINAS NUCLEARES
A Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados rejeitou na quarta-feira (7) o Projeto de Lei 4709/04, que proíbe a construção de novas usinas nucleares no Brasil até que o País disponha de um depósito definitivo de rejeitos radioativos. A proposta define como “novas usinas nucleoelétricas” aquelas projetadas depois das usinas de Angra 1, 2 e 3.
http://www.ecodebate.com.br/2014/05/12/camara-rejeita-exigencia-de-deposito-definitivo-de-rejeitos-radioativos-para-construcao-de-futuras-usinas-nucleares/
Publicado em maio 12, 2014 por Redação
Tags: energia nuclear, resíduos nucleares
Como tem caráter conclusivo e foi rejeitado pela única comissão que analisaria seu mérito, o projeto será arquivado, a menos que haja recurso solicitando a análise do texto no Plenário.
De acordo com o projeto, apresentado pelo deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), o depósito definitivo não poderia ficar próximo às usinas, como os atuais, mas em locais isolados que não possuam falhas geológicas.
Autor do parecer vencedor, o deputado Fernando Ferro (PT-PE) defendeu a rejeição da proposta. Ele argumentou que os principais países produtores de energia nuclear, como a França, ainda não possuem depósitos definitivos para seus rejeitos de alto nível de radiação, mas nem por isso são obrigados a paralisar seus programas de geração de energia nucleoelétrica.
“Se esses países conseguem administrar com segurança os seus rejeitos, mais facilmente podemos nós, que possuímos um parque nuclear cuja ordem de grandeza é bem inferior”, disse Ferro.
Reportagem - Murilo Souza
Edição – Daniella Cronemberger
Agência Câmara de Notícias EcoDebate, 12/05/2014.
Sobre o assunto:
Falta de espaço para lixo atômico pode desligar usinas de Angra 1 e 2
http://www.remabrasil.org/Members/suassuna/campanhas/falta-de-espaco-para-lixo-atomico-pode-desligar-usinas-de-angra-1-e-2/view
COMENTÁRIOS
João Suassuna - Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Recife
Esse povo está variando do juízo! Proponho que se leve um tonel desses, abarrotado de lixo atômico, para ser destampado na seção da Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, para ver a reação dos ilustres parlamentares que votaram a favor dessa estultice. Ninguém merece!
José do Patrocínio Tomaz Albuquerque - Hidrogeólogo e Consultor
Prezado João Suassuna,
Aí o Ferro (Fernando, PT/PE) ia derreter. Pimenta nos ... dos outros é
refresco. O argumento dele é muito fraco. Em um país como o nosso, em que se
deixa faltar água para abastecimento de populações urbanas e rurais, em que
se esquecem, segundo os atuais dirigentes do ONS e do Ministério de Minas e
Energia, de fazer a manutenção de redes de distribuição que provocaram já
diversos apagões (a esta justificativa deve-se adicionar a falta de operação
corretas dos reservatórios de usos múltiplos), pensar em construir usinas
atômicas e, mais, sem definir locais seguros de colocação de lixo atômico,
já em si uma aberração, é uma grande irresponsabilidade. Isto,sem considerar
que, como foi dito por Bautista Vidal, não há segurança em energia atômica.
Ele não disse que a França, foi não foi, envia o lixo, via navios, para os
mares de outros países, inclusive o Brasil.
Abraços,Patrocínio.
por João Suassuna — Última modificação 13/05/2014 11:41
terça-feira, 3 de junho de 2014
PALMA FORRAGEIRA: UM ADENSAMENTO PROVIDENCIAL.
Artigo de João Suassuna
Publicado em junho 3, 2014 por Redação
Tags: agricultura, semiárido
[EcoDebate] As espécies Opuntia fícus indica e Nopalea cochenilifera representam, botanicamente, as variedades, Palma Gigante e a Miúda, respectivamente. Essas xerófilas vêm salvando a pecuária do Semiárido nordestino, quando da ocorrência das secas que assolam a região. No início dos anos 2000, o ex-deputado pernambucano, Ricardo Fiúza, preocupado com a alimentação da pecuária do Estado de Pernambuco, viajou para o México e Estados Unidos, para conhecer, naqueles países, a produção de Palma Forrageira plantada de forma adensada. O parlamentar queria encontrar formas de potencializar, em volumes, a comida dos grandes ruminantes em Pernambuco, principalmente os criados em regime de confinamento.
Levou consigo nessa viagem, o engenheiro agrônomo Paulo Suassuna e o zootecnista Alberto Suassuna, que já vinham trabalhando com a cultura da Palma no Nordeste seco. A viagem foi revestida de grande êxito, pois veio a capacitar os referidos técnicos, em uma nova forma de plantar a distinta xerófila no Semiárido brasileiro. Paulo e Alberto ao regressarem ao Brasil, conseguiram localizar e adaptar, para as condições semiáridas nordestinas, todo o processo de plantio adensado que haviam observado no exterior e alcançar, nos plantios brasileiros, as produtividades que estavam sendo obtidas no estrangeiro. Na ocasião, a Palma alcançava, no Nordeste, uma produtividade média em torno de 50 toneladas por hectare, e passou a produzir, adotando-se as novas técnicas de plantio, cerca de 400 toneladas/ha. Um ganho volumétrico fantástico, se levada em consideração a importância da cactácea no arraçoamento dos animais em períodos de estiagem.
Absorvidas as novas técnicas de plantio, os técnicos passaram a localizá-las e adaptá-las à região semiárida brasileira, iniciando suas ações no sertão do Estado de Pernambuco, o qual passou a produzir a cactácea em quantidades suficientes, enchendo de alegria os produtores rurais, ao verem, em um único hectare de suas propriedades, o plantio alcançar cerca de 400 toneladas, volume de biomassa suficiente para alimentar, por exemplo, e de forma sustentável, 200 carneiros. Um fato inédito, que veio a contribuir para a solução das mazelas trazidas pelas secas recorrentes no semiárido pernambucano.
No desenrolar dos trabalhos em Pernambuco, no entanto, algo curioso e inédito ocorreu: as autoridades responsáveis pelo setor agropecuário do Estado foram, gradativamente, perdendo o interesse pela nova técnica de plantio da Palma Forrageira. Uma atitude sugestiva de inveja começou a surgir entre os dirigentes pernambucanos desse setor, que viam na projeção dos técnicos, nos noticiários televisivos do País, difundindo a nova tecnologia de plantio, um complicador para a divulgação de suas imagens (dos dirigentes), como reais responsáveis pelo aumento da produtividade da cultura da Palma no Estado de Pernambuco. Passaram a fugir da Palma, como o diabo foge da cruz. A partir daí, o agrônomo Paulo Suassuna não teve mais espaços de trabalho nesse Estado, seguindo sua vida à procura de outras regiões áridas do Nordeste que tivessem interesse em absorver sua nova técnica de plantio, o mesmo ocorrendo com o zootecnista Alberto Suassuna.
Após o fiasco político havido nas ações de adensamento da cactácea em Pernambuco, Paulo Suassuna procedeu a igual investida no Estado da Paraíba, onde apresentou seu projeto para as autoridades locais, obtendo boa receptividade. Após ter implantado alguns projetos adensados, com o igual êxito obtido em Pernambuco, para surpresa do técnico, idêntico fato de inveja, das autoridades, voltou a ocorrer. A Paraíba também não apoiou os esforços do Agrônomo, na sua luta incansável de demonstração da viabilidade de plantio da Palma adensada, como sistema salvador da pecuária nordestina. Um fato político triste e realmente lamentável para a pecuária paraibana, e por que não dizer da pecuária do Nordeste como um todo.
Mas as notícias de sucesso dessa nova técnica de plantio adensado da Palma, oriundas das experiências havidas nos estados da Paraíba e de Pernambuco, embora tenham ocorrido em curto espaço de tempo, começaram a circular e a despertar o interesse de outras regiões secas do Nordeste. Paulo Suassuna começou, então, a cumprir uma extensa agenda de palestras e viagens, no país e no exterior, difundindo a nova técnica de plantio da cultura por ele localizada e adaptada. Dessa feita, o Estado de Sergipe, através do Sebrae local, convidou o agrônomo para uma apresentação em Aracaju. A explanação do técnico foi revestida de sucesso absoluto. Paulo Suassuna optou, então por residir naquele Estado que carinhosamente o acolheu, passando a elaborar planos e metas para a difusão da forrageira, dessa feita na região semiárida sergipana.
Com esse gesto de acolhimento técnico, as autoridades do setor agropecuário de Sergipe demonstraram uma forma de tratamento completamente diverso daquelas demonstradas pelos estados da Paraíba e de Pernambuco. Não faltaram ao agrônomo, o respaldo e o incentivo institucionais necessários aos trabalhos desenvolvidos no campo. Tanto isso é verdade, que os índices de produtividade, no Estado de Sergipe, alcançaram os valores mais elevados do planeta. Para se ter ideia desse fato, o Rancho Flora, no município de Canindé do São Francisco (SE), pertencente a Magno José de Melo (Nininho das Cabras), tornou-se o campeão mundial em termos de produtividade com a referida cultura, chegando a alcançar 732 toneladas em um único hectare. Um ganho fantástico, que bem exemplifica os cuidados adotados pelo produtor, que soube absorver, com a devida maestria, os novos ensinamentos técnicos, através dos indispensáveis apoios institucionais proporcionados pelo Sebrae-SE.
Atualmente, Paulo Suassuna está desenvolvendo vários projetos em Sergipe, com previsão, até 2020, de continuar obtendo produtividades, nos plantios adensados, superiores a 400 toneladas/ha.
A Cochonilha do Carmim
Um fato digno de nota, nesse relato, diz respeito aos ataques severos da Cochonilha do Carmim (Dactylopius coccus), realizados nos palmais da região Setentrional nordestina. Esse inseto, praticamente aniquilou os palmais da região, trazendo prejuízos e desespero ao produtor, bem como uma nova realidade para ao setor agropecuário regional: juntamente com o fenômeno recorrente das secas, o ataque da Cochonilha do Carmim trouxe o perigo da inviabilização da criação do gado bovino nos limites do Nordeste seco.
No Semiárido sergipano, os problemas de ataques de cochonilhas existem, mas com outra espécie do inseto. Em Sergipe, os ataques, realizados pela Cochonilha de Escamas (Diaspis echinocacti), quando comparados aos da Cochonilha do Carmim, são menos danosos para os palmais. Em tais caso, os controles desses insetos não mais fáceis de serem realizados, tornando-se uma praga com reais possibilidades de convivência, sem a preocupação com a severidade dos danos causados pela Cochonilha do Carmim.
As dificuldades atuais de se combater o inseto por vias químicas (uso de defensivos), motivou Paulo Suassuna, à implantação, acompanhado de um sócio (pessoa física), no município de Juazeirinho (PB), zona de ocorrência da Cochonilha do Carmim, do maior banco de germoplasma da cultura da Palma do país. São 160 variedades que estão sendo testadas e observadas, para se saber de suas resistências aos ataques desses insetos. Essa experiência está se revestindo de grande êxito, tendo em vista ser, a variedade resistente, uma das poucas alternativas de solução que se tem atualmente encontrado para esse grave problema, tendo em vista a proibição, pelo Ministério da Agricultura, do uso de defensivos agrícolas, nos ataques verificados na cultura da Palma Forrageira no Semiárido nordestino.
Novos Projetos de plantios adensados
Os ciclos secos que o Nordeste brasileiro vem apresentando (2011, 2012, 2013 e parte de 2014 foram secos), com os ataques severos da Cochonilha do Carmim, foram fatores que resultaram em panoramas sombrios para a agropecuária regional. Estima-se, por exemplo, que a pecuária paraibana, em 2013, tenha sofrido uma diminuição em cerca de 70% do efetivo dos animais, devido à morte por inanição (fome e sede), ou mesmo pela venda destes, antes de sucumbirem ao flagelo. Para a reversão desse quadro, as novas técnicas de plantio da Palma, bem como a identificação de variedades resistentes ao ataque da Cochonilha, poderão se traduzir em soluções promissoras e bem-vindas.
Recentemente, em visita à região dos Cariris Velhos da Paraíba, especificamente no município de Taperoá, tive o privilégio de conhecer um trabalho de adensamento de Palma Forrageira (Opuntia) implantado na fazenda Pau Leite, de propriedade de Manelito Dantas Vilar. Foram plantados 4,2 ha de palma, para a obtenção de material (sementes) necessário à expansão da cultura em uma área de plantio adensado, de cerca de 30 ha. A ideia, nessa nova área, é a de possibilitar a criação, de forma sustentável, de cerca de 1000 cabeças de gado bovino em regime de lactação. Uma meta com possibilidades reais de ser atingida, que poderá fazer com que, uma única propriedade paraibana, venha a dar o exemplo de que é possível reverter o quadro sombrio no qual se encontra a Agropecuária do Estado, bastando, para tanto, o uso das técnicas adequadas de convivência com as secas, que estão atualmente em vigor, sendo uma delas o plantio adensado da palma forrageira.
Alguns aspectos técnicos (com fotos) do plantio de Palma Forrageira da fazenda Pau Leite:
Por ser uma área plantada (4,2 ha), com vistas à obtenção de sementes (raquetes), para a ampliação de futuras áreas, o plantio foi realizado fazendo-se o uso da irrigação por aspersão.
Para o plantio, as raquetes das palmas foram subdivididas em 110.000 pequenos retângulos (propágulos), número suficiente para se plantar 1 ha, adotando-se a nova técnica de adensamento.
Devido à grande competição reinante no plantio adensado, foram feitas as análises de solos antes do plantio, com vistas a se proceder a correta e necessária adubação da área.
O método de plantio adensado, em regime de sequeiro, foi orçado, na fazenda Pau Leite, em cerca de R$ 13 mil o hectare. Como a área está sendo irrigada, o custo do plantio, nessas condições, subiu para R$ 15 mil/ha.
Como a área do Pau Leite é susceptível aos ataques severos da Cochonilha do Carmim, e a variedade da cultura escolhida para o plantio (Opuntia) é igualmente susceptível a esses ataques, os técnicos responsáveis pelo palmal, optaram pela articulação constante com os centros de pesquisas da Paraíba, bem como as universidades locais, no sentido de obterem informações que venham proporcionar a condução da cultura da Palma de forma a mais segura possível, e dentro dos parâmetros esperados para o alcance dos objetivos.
Recife, 30/05/2014
Sobre o assunto:
TECNOLOGIA DO CULTIVO INTENSIVO DA PALMA: um projeto promissor
http://www.remabrasil.org/Members/suassuna/projetos/tecnologia-do-cultivo-intensivo-da-palma/view
O Sebrae inova no Semiárido sergipano, com o plantio da Palma adensada.
http://www.remabrasil.org/Members/suassuna/projetos/o-sebrae-inova-no-semiarido-sergipano-com-o-plantio-da-palma-adensada/view
Palma Forrageira: Consultor do Sebrae recebe homenagem de universidade
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* João Suassuna – Eng° Agrônomo e Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco
EcoDebate, 03/06/2014
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